Li este teu texto já há uns dias, e fiquei a mastigá-lo, ou a saboreá-lo, se preferires. Às vezes acontece-me: preciso de uns dias para que a minha cabeça comece a fazer associações sobre o que li.
Tenho cá em casa um "monstrinho do querer": o bebé quer... o bebé quer... o bebé quer! É o querer imediato de que falas, sem concessões nem espaço para o desejo. Para desejarmos alguma coisa, temos de primeiro sonhar com ela: e para sonhá-la precisamos de simbolizá-la, pensá-la quando ela não está lá. O desejo pressupõe a antecipação de um prazer, um prazer que se adivinha, se vislumbra, se visita em sonhos.
No mais velho já se pressente, a espaços, o olhar ausente do desejo: claro que também faz coro com o irmão na infinidade de quereres, mas já fica a sonhar, a imaginar a coisa, na antecipação do gozo. Já constrói e habita castelos no ar, já consegue viver noutra dimensão (transcender o querer).
O choro dos bebés é um grito de quereres: carinho, aconchego, miminhos, leite, colo, sorrisos, caras, olhares... são quereres imperativos, imprescindíveis e inadiáveis: ele precisa disso tudo (e muito mais) para sobreviver.
À medida que crescemos, e que vamos desenvolvendo a capacidade de imaginar, de fantasiar, vamos-nos tornando cada vez menos escravos do querer, cada vez mais donos e senhores dos nossos impulsos e desejos, vamos conseguindo adiá-los, controlá-los, e muito mais importante, aprendemos a tirar prazer desse adiamento (é o prazer de realizar algo que foi muito desejado, e durante algum tempo). Esta capacidade só se adquire quando se consegue viver a frustração, lidar com a raiva e a zanga que ela acarreta, em suma, ser capaz de sublimar o querer em desejo (realizá-lo na fantasia).
O querer é, assim, tudo aquilo que disseste, e também o espaço emocional de um percurso essencial à nossa vivência enquanto seres humanos: é uma etapa fundamental da vida, sem a qual desejar e crescer seriam impossíveis.
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