quinta-feira, março 02, 2006

CANSAÇO

é chegar ao fim do dia, exausta, entrar na cozinha e ter um puto de 6 anos em cima da bancada, de joelhos, para conseguir abrir o armário de cima.

Primeiro, a surpresa; depois, a perplexidade; depois, o grito de zanga; depois, os berros e os soluços de decibéis acima do aconselhável, para quem se encontra tão cansada, vindos das goelas do puto.

Caramba!!!

Os pés dele estavam em cima dos bicos do fogão! E então, está explicado o mistério dos bicos do fogão que, de vez em quando, rodam misteriosamente, sozinhos, sem ninguém lhes mexer, e a gente só dá por isso porque (felizmente!) este gás tem um cheiro fortíssimo (ou então é o meu nariz que é sensível demais!)

Já tinha acontecido umas duas ou três vezes. E sempre fico traumatizada com aquilo. Depois vem a paranóia: já estou na cama, e penso: será que ficou algum bico aceso? E segue-se a compulsão da verificação: lá venho eu escada abaixo! É mesmo assim: obsessão pura! Só (ainda) não sonhei com isso. Mas às vezes penso: e se acontece quando estamos a dormir, e os miúdos cá em baixo, sozinhos? (Às vezes ao fim de semana é assim).

Bom, reunião familiar: David, não podes ir aos armários da cozinha quando estás cá em baixo sozinho. Não vais, esperas que a mãe ou o pai acorde. Quando estamos cá em baixo, também é melhor pedires. Isto repetido, vezes sem conta (às vezes até eu fico aborrecida com a minha obsessão em repetir as coisas, uma e outra vez, para ter a certeza que aquelas cabecinhas entendem).

E agora isto... Caramba! Ele já não é nenhum bebé! E foge-me escada acima, a berrar que nem um doido! Vou atrás dele, tenho de o agarrar com toda a força, parece que está possesso; não quer olhar para mim, não quer falar sobre o assunto, não sabe, não se lembra, não sabe, não se lembra...

Mas que diabo! Depois de uma grande luta lá prometeu que não repete. Mas nunca fiando...

Enfim... Amanhã é dia de tirar o gesso. Pelo menos isso.

(Há dias em que o papel de mãe parece que encolheu, como a roupa que metemos na máquina a temperatura elevada demais. E tem de levar assim uns esticões. Mas, mesmo assim, permanece aquela sensação estranha de estarmos dentro de um fato apertado demais...

Que digo eu? O papel de mãe? O que é isso?

Ser mãe não cabe em nenhum papel. Ser mãe é uma condição intrínseca à nossa pele. Diria antes que é a nossa pele, o nosso corpo que encolheu. Outrora inchou para albergar o nosso bebé na sua enorme barriga. Agora sobram-lhe braços e pernas, e às vezes falta-lhe a força e a determinação na voz. Porque ser mãe é autoridade, repressão, regras, educação, respeito, gritos e palavras duras, também. Também. E, principalmente aí, nesse lugar de confronto, de conflito, a alma tem de tomar posse. Mas a alma inteira, completa, una, sólida, como uma rocha. A alma agressiva de um murro na mesa, de um basta, de um não. A alma que não se compadece com o choro. Que chora também, mas que está lúcida. Que recua, que obriga a olhar nos olhos, a engolir o orgulho, a aplacar a vergonha. A alma de uma mãe é sinistra como os atalhos escondidos das florestas onde os meninos se perdem. Cheios de pedras que magoam os pés. E atravessá-los deixa marcas e feridas. Como os espinhos das rosas que apertamos com força, na ânsia de ver o vermelho do sangue, de sentir a picada da dor. A alma sabe que só sente dor quem está vivo. E anseia, sempre, por provar a vida do copo de fel, às goladas sôfregas de quem morre de sede.

A alma não se cansa de buscar a verdade. E a verdade às vezes exije a luta do ser, a luta do sentir, a luta do mostrar. Porque dói, dói, dói. Às vezes dói ser mãe, como dói viver. Como dói acordar e como dói sofrer, e viver, e morrer.)

4 comentários:

Anónimo disse...

Em suma, ser mãe não é nada simples, não é?

Mónica disse...

tadinha da mãe galinha
:-)

papu disse...

Bom dia bom dia bom dia :)))
Olá formiguinha.
Vou já dar novidades

CLS disse...

Concordo, é duro ser mãe, às vezes seria tão mais fácil ceder para não ter q ouvir choros e birras e não ficarmos a pensar q, naquele momento, os filhos não gostam mesmo nada de nós. Mas fazermos isso seria demitirmo-nos do nosso papel de educadores e formadores de futuros adultos. É duro ser mãe, mas já não saberia viver sem o ser!
Bjs