sexta-feira, março 17, 2006

TENHO

esta imagem gravada na memória, nítida como uma fotografia.

Foi na noite do dia em que o Diogo partiu a perna. Tivémos de voltar ao Hospital porque ele não parava de chorar com dores.

Fui com ele na ambulância, porque o pai teve de ficar em casa com o David. Ele estava tão cansado (se calhar até seria mais por isso que chorava...) que adormeceu na viagem, deitado na maca, agarrado a um balão com a forma de uma cara que a paramédica, muito simpática, lhe ofereceu.

Quando chegámos, o átrio das ambulâncias estava deserto. Estava muito frio. Eu saí primeiro, e meti-me para dentro da porta de vidro, mas fiquei ali a olhar para ele, suficientemente perto da porta para esta não se fechar. Eles desceram a maca, lentamente, e é deste momento que guardo a imagem. O meu filho deitado numa maca, um corpo pequenino numa maca enorme, tapado por cobertores, vestido com o seu pijama azul, a dormir profundamete. A sua expressão não era suave, mas dormia serenamente. O mecanismo que faz descer a maca é um pouco lento, e eu fiquei ali, parada, a olhar para ele, a sentir o frio na cara e no coração. Apesar de o saber bem, aquela imagem era dolorosa, por todo aquele aparato de macas e ambulâncias e cuidados médicos. E, naqueles longos segundos, vislumbrei cenários dolorosos, visitei angústias alheias, numa espécie de elo imaginário com as imprevisibilidades do destino.

Tenho esta imagem gravada na memória, como uma fotografia, e acho que nunca mais me vou esquecer dela.

2 comentários:

Bird disse...

Como te entendo...

essas imagens colam-se à pele... e à alma!
Abraço-te...

Anónimo disse...

O olhar para o lado não é Papu? Perceber a angustia em que alguns pais vivem.
Bem hajas, tu e todas as pessoas, que o conseguem fazer.

Um abraço grande amiga.