sexta-feira, junho 20, 2008

Respiração

Junto ao lago, ouvem-se as vozes líquidas dos peixes, dos pássaros, das garças e do vento nas árvores. A luz, vestida de verde, derrama-se lá de cima do cinzento das nuvens, coada pelas folhas das árvores, e fica a pairar como uma coisa líquida e vegetal, a encher-nos os olhos de mistérios com a textura das algas e do fundo dos mares. O ar estanca-se ali, debaixo do tecto de catedral formado pela copa das árvores, e também ele se tece de verde, e espalha-se pelo espaço com a suavidade de uma renda de bilros, a acariciar-nos a pele do rosto naquele ponto exacto onde as lágrimas deixaram, num sulco, o seu rasto salgado. No chão, junto à película de humidade que se evola, como uma respiração, um tapete de folhas secas que ficaram ali desde o último outono cobre o gigante adormecido, estendido por entre as raízes, as minhocas e as larvas, o húmus e as formas infinitas de vida que pululam, rastejantes e subterrâneas, no coração da terra. Os esquilos saltitam, e são a única presença a quebrar a liquidez dos sons, com ruídos secos e curtos, ásperos, que fazem estalar os ramos das árvores, sacudir as folhas verdejantes, amachucar as folhas mortas e estaladiças do chão, numa agitação leve e assustadiça.
E o silêncio respira.

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