domingo, outubro 18, 2009

Ainda derramando leite

Ler dá-me vontade de escrever. Quanto mais leio, mais tenho vontade. Geralmente, o que leio não chega aos pés do que escrevo*, mas não perco muito tempo com isso. Porque o que escrevo sai-me da alma e acaba, mal ou bem, por cumprir esse desígnio de me devolver um sentimento de fé.

(* Ah! Ah! Se eu fosse dada a teorias freudianas diria que me fugiu a boca para a verdade, e que no subconsciente sou mas é uma convencida e das grandes, mas eu juro que queria escrever o contrário - o que escrevo não chega aos pés do que leio - e só agora dei pelo erro!)

Acabei o Leite Derramada e ainda estou embrenhada em todas aquelas linhas que nos vão empurrando ao longo do livro, como se mãos invisíveis nos guiassem na visita a um velho casarão cheio de quartos, uns a seguir aos outros, sem ordem ou arrumação, alguns obscuros e perdidos nas sombras, outros cheios de janelas por onde a luz nos bate nos olhos e nos encandeia. Um livro é bom quando a gente começa a ler e não consegue parar, ou não quer parar, e ainda que pare, fiquemos ainda a viajar naquele mar de palavras enquanto fazemos outras coisas (ou fingimos fazer). Um livro é bom quando nos leva a constinuarmos a estória, em surdina, para dentro da nossa história. Esse livro passa-se dentro da cabeça de um velho moribundo, com a memória comida pelo Alzheimer, e acho que nunca li relato mais comovente e mais consistente com os restos de uma vida.
Também eu estou a escrever uma longa estória, toda ela passada dentro da cabeça dos personagens, e já me interroguei várias vezes se conseguirei a proeza de aguentar essa estrutura sem tornar aquilo num sucessivo desbravar de memórias maçudo e cansativo. É uma grande proeza, de facto, aguentar esse tom durante páginas e páginas sem tornar a leitura excessiva e cansativa. Proeza que tenho dúvidas de conseguir.

1 comentário:

ana g disse...

lapsus linguae? acto falhado?
:)
bem, não sendo freudiana, gosto de Te ler. Ai gosto, gosto :)