Dizem que neva esta semana. O frio assim promete.
São quatro e meia e lá fora escurece.
O Diogo voltou à escola hoje, depois de dois dias de quarentena.
A minha garganta arranha outra vez. Para dizer a verdade, muitas outras coisas arranham, mas não me apetece falar disso. Ou não posso. Ou escolho não o fazer.
Os olhos, esses não arranham, ferem.
Ouço o Diogo tagarelar dentro do banho. O som da televisão. Um filho silencioso a ver televisão.
Porque é que só lhes dá vontade de falar à hora de ir para a cama?
As horas passam a correr. A minha avó dizia isto
os dias passam a correr
e eu não imaginava o que ela queria dizer.
Podia ficar assim para sempre.
O frio lá fora. O som da televisão. A comida ao lume.
A minha imagem reflectida no vidro da janela da cozinha.
Sei que não. As rugas virão, eu sei.
Aliás, espenta-me que ainda não se tenham feito anunciar.
Afinal estou a meio da estrada. Na idade média.
A minha avó tinha o rosto encarquilhado de rugas. Não lhe conheci outra cara.
Será que temos mesmo ascendência asiática?
Mistério.
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