quinta-feira, março 24, 2011

Vertigem

A exaustão de pensar. A exaustão de não ser capaz de parar. Respirar. Desligar. Mas não. Os pensamentos correm, uns atrás dos outros, e nós quase a fechar os olhos; se ao menos os pudéssemos contar, como aos carneirinhos. Não podemos. São velozes, os pensamentos. Tentamos enxotá-los, como às moscas; em vão. Multiplicam-se, multidões de bactérias ao nosso redor; saem-nos pelos ouvidos, pelos olhos, pela boca. Fechar os olhos, erguer um muro e dizer, basta! Nada. São surdos, e imunes à fadiga. Alimentam-se dela. E então a energia vai-se. Erguer um pé pode custar toneladas de esforço. Um braço. Um gesto. Os membros duros como cimento. O corpo petrifica, e com ele a alma. E então vem o desejo do mar, da água; o anseio da liquefação. Poder diluir-se na corrente de um rio. Poder deixar-se ir. Sem rumo. Sem saber. Nada. Não saber nada. Tudo é um mistério. Um absurdo total. Os mistérios podem tornar-se interessantes quando são título de livros ou de filmes; ou quando são os dos outros. os nossos raramente nos dão alguma coisa de bom, a não ser dores de cabeça. E pior ainda quando tudo à nossa volta se torna um mistério. Quem somos. De onde vimos. Para onde vamos. O que queremos. Estas perguntas podem ser motores extraordinários de busca e encontro de identidade quando alcançam as profundezas e as subtilezas da existência; mas quando se referem às questões básicas e primárias da vida deixam essa mesma identidade destroçada. Se não sabemos quem somos, não conhecemos nada; menos ainda o que existe à nossa volta e quem nos acompanha na viagem. De repente não conhecemos ninguém. Apercebemo-nos com angústia que as pessoas que julgávamos conhecer afinal são perfeitos estranhos. O que é pior, nunca as conhecemos de facto. Nunca fizémos a mais pequena ideia. De nada. A nossa vida torna-se um emaranhado de coisas que não entendemos. A única coisa inteligível é o esforço contínuo que sempre fizémos para entender, para compreender; em vão, já que não entendemos nada. Estamos sós, como sempre nos sentimos. Não podemos fazer perguntas, porque ninguém nos vai responder. Se ao menos pudéssemos parar de pensar... Mas não. O pensamento é a única coisa que corre, dentro de nós, e à nossa volta; um rio veloz que nos deixa a boca seca e os ombros derrotados.

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