sábado, outubro 29, 2011

Restos

Olhava em volta, e só via restos. Restos do jantar de ontem. Restos de espuma na banheira. Cabelos nos ralos. Restos de luz no vidro da janela. Réstias outonais, folhas castanhas em desalinho. Teias de aranha pelas paredes, nos tetos, aos cantos. Restos de porcaria na alcatifa. Depois censurava-se. Não, não se martirizava; calava-se. Calava o grito e o desejo de gritar. Falar em turbilhão, cuspir as palavras, vomitá-las; falar falar falar até encontrar a voz. A voz antes do medo. A voz antes do desastre. A voz antes de o mundo ter desabado.

A voz, e os restos.