sexta-feira, julho 22, 2005

ÚLTIMO DIA DE AULAS


O céu cinzento, as folhas das árvores ondulando ao vento, mais parece que estamos no outono do que no pino do verão. As crianças correm na saída das aulas, hoje talvez mais animadas pelas férias que começam. Trocam-se ramos de flores, pequenas prendas. Despeço-me das professoras, Miss Carter and Mrs. Smith, com sorrisos e desejos de boas férias. O David está despenteado e com um alto perto do olho. "O que foi isso?", pergunto. "Olha, foi quando eu caí e bati ali naquilo, ainda bem que nem chorei!" e espeta-me com o saco e com o casaco na mão e pede para o ajudar a abrir o pacote de gomas, "posso comer já uma?". Abro o pacote, mas continuo a inspeccionar-lhe o olho. A pele está dura, um bocadinho inchada, magoada, mas é uma área pequenina, nada de mais. "Mas isto deve ter doído muito, filho, olha se fosse mesmo no olho?", "E nem chorei" volta ele a dizer, "Não? Mas podias ter chorado um bocadinho, que não fazia mal..." Lá vamos, pergunto-lhe pelo prémio, se gostou, ele diz que sim, está animado. "Mas sabes porque é que recebeste o prémio, não sabes?", "Sim", diz ele, meio aéreo, e já começa a mudar de assunto. "Foi porque foste muito bom em matemática, queres ver?", e mostro-lhe o diploma para ele ver. "Ah...", faz um ar entendido, mete mais uma goma na boca e lá vamos nós.

Passamos no supermercado. Quando saímos, eu com três sacos cheios, ele pensativo. "Porque é que as pessoas querem trabalhar ali? É para ganharem dinheiro?", "Sim, filho, as pessoas trabalham para ganhar dinheiro", "Eu cá quando for grande também quero ganhar assim muito dinheiro como aquela..." faz uma pausa, absorto. Acho que está a fazer contas de cabeça. Sorrio: "Mas o dinheiro que está na caixa não é todo para ela, filho, é para o dono do supermercado. Depois o dono do supermercado paga-lhe um ordenado, mas não é o dinheiro todo que vai para a caixa". "Ah...", diz ele outra vez, e fica em silêncio. Acho que acabei de lhe gorar as expectativas de um futuro prometedor como caixa de supermercado. Também eu me lembro de achar, com inveja, que aquelas notas todas e todas aquelas moedas que víamos quando se abria a caixa registadora eram para a simpática senhora que nos atendia. E que desilusão, quando me disseram que não. Mas então para que é que ela trabalha tanto, se não for para ficar com todo aquele dinheiro?, lembro-me de pensar. Realmente este mundo é bem estranho, aos olhos deles. E aos nossos também, convenhamos.

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