terça-feira, agosto 30, 2005

7 DEZEMBRO 1994

No dia em que te conheci jantei com uma amiga. De repente estávamos ali e tinhamos tanta coisa para dizer uma à outra. De repente vi a nossa amizade desenhar-se cada vez mais. Falámos imenso, de nós, da nossa forma de viver e nos entregarmos, das nossas angústias, das nossas dúvidas, da nossa vida. E no fim do jantar, tive a certeza de que ela já pertencia à minha vida, e eu à dela.

Depois fomos para o Bairro Alto e lá encontrámos o resto do pessoal que estivera connosco na manif contra as propinas, nessa mesma tarde. E eu quase me esqueci da minha falta de à vontade com as pessoas que mal conheço. Nesse dia sentia-me bem, sentia-me livre. Porque tinha ficado selada a nossa amizade.

Depois apareceu um amigo nosso de psicologia e perdemo-nos do resto do grupo, já não me lembro bem como. Foi então que apareceste.

Vieste de repente, vindo do nada, e abraçaste a minha amiga como a alguém muito querido. E eu só queria saber quem eras. Porque ao primeiro olhar me atraíste. Mas acho que nem me apercebi, foi uma atracção tão suave que na altura nem dei bem por ela. Foi um olhar para ti que me deu vontade de te conhecer, falar contigo, sei lá.


Foi como um fio de água no braço, que nos acaricia docemente, mas que podia ser a dormência oculta do sangue nas veias. Não sei se isto foi tudo imaginação minha. Estava muito feliz nesse dia, e tinha aquele olhar mágico que embeleza as coisas à nossa volta.

Depois fomos para o Pescador, e desapareceste, e quase nem dei por isso. Fiquei com o outro gajo a gramar uma gaja completamente louca, porque a minha amiga entretanto também desaparecera.

Lá nos encontrámos todos outra vez e sentámo-nos os quatro à volta de uma mesa daquele bar, o Pescador, uma mesa minúscula no meio de outras cheias de gente, e a luz fraca dos candeeiros na parede derramava sombras escuras no ar, que nadavam à nossa volta como peixes num mar nocturno.

E de repente senti as tuas pernas de encontro às minhas, e nem podia fugir-lhes porque o espaço debaixo da mesa era minúsculo. E ficámos o tempo todo com as pernas coladas, e o teu calor começou a misturar-se com o meu e era bom. Era bom pensar que poderias estar interessado em mim, embora isso fosse só uma fantasia e eu não acreditasse, sempre o meu velho trauma, quem vai gostar de mim? E às tantas comecei a sentir-me mal, sentia as tuas pernas de encontro às minhas e não sabia o que pensar, aquele contacto assustava-me, não sabia o que fazer-lhe para fugir, era assim uma ambivalência deliciosa.

Também não tinha muito espaço mental para pensar no que estava a acontecer porque uns gajos já completamente bêbados colaram-se a nós e estiveram o tempo todo para ali numas grandes conversas, e nós a dar-lhes trela, e só no fim é que percebemos que eles estavam era no engate. Comecei a passar-me, e quando já estava a chegar ao limite da minha paciência a tua perna começou a empurrar a minha e de repente senti a tua mão.

A tua mão tão leve.
Acho que o mundo parou. Aquela carícia entonteceu-me
Apetecia-me ficar ali, que aquilo nunca mais acabasse, e ao mesmo tempo não queria que aquilo estivesse a acontecer.
E tão depressa como começou acabou.
E parecia um sonho. Parecia que tinha sido imaginação da minha perna.
Fiquei tão nervosa. Pedi um cigarro ao outro gajo e tu estendeste-me o isqueiro aceso. Acho que as minhas mãos tremiam.

Depois fomos para os Três Pastorinhos.
E subitamente quis esquecer-me de tudo, abandonar-me àquela sensação cálida na minha perna, e dancei, dancei, até à exaustão. E só eu sabia que era para ti que dançava assim. Eram os teus olhos que imaginava a percorrerem o meu corpo. As tuas mãos. Os teus braços.
Como dancei nessa noite.
Sem parar de pensar em ti.

E junto ao rio toquei o teu coração.
E quando o sol se pôs no rio eu compreendi que já não seria possível apagar o teu rosto. Que os teus olhos tinham ficado colados aos meus sonhos.
Não sabia para onde íamos, mas o imprevisto aliciava-me.
O futuro era incerto, mas isso ainda emprestava mais magia a tudo o que imaginava que nos esperava. E imaginava tanto.
Foi assim.

4 comentários:

papu disse...

Este é para ti, meu amor. Encontrei-o no meio de textos antigos, e não resisti a trazê-los comigo. Um grande beijão.

Anónimo disse...

Que o amor entre o matulão hip-hoppas do boné e a psic-papu-seco :-)))perdure através das brumas da Inglaterra e das inevitáveis brumas da vida.

papu disse...

Olá olá!
Vejo que já me começaste a ler :))

E bota brumas nisso!
Mas, felizmente, também há o sol e o calor dos nossos corações.
Beijos

Anónimo disse...

Uma historia de amor
POSSAS PAPU, QUE LINDOOOOO