O LIMITE DOS DIAS

Tenho tomado daqueles banhos longos, demorados, com a água quente a escorrer pelos cabelos até às pernas.
Daqueles que nos deixam a vista embaciada e o coração quente, assim como húmidas de desejo as paredes em azulejos turvos.
E deixo a água escorrer até desfocar a vista.
Até soletrar a pele em cada poro
até o frio acender o medo no espelho a pingar orvalho.

Estou a precisar de férias, costumamos dizer quando misturamos cansaços de alma com trabalhos (es)forçados.
Pois olha, eu estou a precisar de trabalhos. De viagens. De dias longe da família. Longe da domesticação caseira.
Estou a precisar de deixar de ser apenas mãe.
Estou a precisar de crescer, de evoluir, de me espreguiçar demoradamente depois do banho.

Sabes que tenho dormido até ao meio dia, às vezes uma, duas da tarde?
Como é que é possível?
Troquei os sonos e trocaram-me as voltas.
E as angústias nocturnas têm-nos visitado amiúde cá por casa.
Todas as noites tenho despertado ao som de vozinhas suplicantes, choros, lamentos, pesadelos.

Uma réstea dos velhos tempos de recém-dormidos?
Não sei, mas que este corpo já não aguenta as noitadas como antigamente, ai isso não.
E que sono que tenho.
Mas, quanto mais sono tenho, mais vontade tenho de despertar.