domingo, abril 26, 2009

Sim, ouvi a tua prece. Mas fingi que não ouvi. Aqui onde estou só vejo o branco infinito do silêncio. Gosto de me perder neste silêncio. Depois são as paisagens da minha vida longínqua que me visitam, paisagens de uma densidade deslumbrante. Queria-te aqui, ao meu lado, e que junto comigo as observasses, e te deixasses maravilhar como se fosses de novo menino. Desertos imensos de areia escaldante. Rios que correm, aflitos, despenhando penhascos agrestes, para depois se espraiarem, preguiçosos, quando a planura das lezírias lhes abre o horizonte de possíveis indolências. Florestas húmidas e impenetráveis onde o silêncio se preenche de ruídos incansáveis e do cheiro rasteiro de corpos solitários. A floresta é como o fundo dos oceanos, escura e intocável. Também no fundo da nossa consciência existe essa fronteira implícita entre aquilo que conhecemos e todo um mundo por desbravar. É junto dessa linha invisível que me quedo, quieta, para escutar as vozes cheias de sonoridades novas que me chegam do lado de lá. Talvez seja mentira e eu, afinal, não te queira aqui; é um território demasiado íntimo, este. Talvez me acredite ligada a ti por um estranho laço que mais não existe entre outras duas almas, apenas a tua e a minha. Talvez eu saiba que lá, nesse rochedo onde me quedo à beira da vertigem dos sonhos, mora o segredo desse mistério que nos une. Por isso não quero que venhas; por isso mando embora a tua tristeza e peço-lhe que te conte da luminosidade destas paragens, da fragância destes desertos, da imensidão destes oceanos. É sedutora, a tua tristeza. Mando-a de volta no meu sopro, mais luminosa e menos triste. Ficarei aqui até ao fim dos tempos. Enquanto sonhares comigo, estarei aqui. Enquanto me pedires que volte, ficarei aqui. Enquanto sentires saudade. Quando me esqueceres, porém, ainda aqui estarei. Apenas os teus olhos já não poderão ver-me. E nessa altura não estarei só. Estarei só, e para sempre, viúva.

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