domingo, junho 13, 2010

Estátua

Apenas a metade. Era tudo o que tinha.
Agora, ver-te inteiro. E a mim. A tudo. Finalmente.
E não saber. Não saber o que fazer com as mãos. Os pés.
A boca. O sorriso. Os olhos, onde por os olhos?
As pernas. Os braços.
O ventre.
O sexo.
Não saber nada. Não ser capaz sequer de desenhar um gesto.
Nenhuma palavra.
As frases partidas, aos bocados. Bocados de um corpo esfrangalhado, pelo chão.
A dor, a dor, a dor.
Ardor.
Olhar, olhar, para onde? Dói. Ter de olhar e doer e saber.
Sem saber.
Dizer.
Transformar-se em pedra.
Que ninguém me veja. Que ninguém me olhe.
Assim, a vida inteira.
Uma vida inteira.
O muro de cimento a esmagar a consciência.
Bater com a cabeça na parede, até doer. Enlouquecer.
Derrrubá-lo com as mãos. As mãos em cacos.
Como é que consegues viver assim?
Eu não consigo. Não sei fingir. Não sei esconder.
Não sei? A vida inteira.
E agora? E agora? As palavras? Que palavras?
O cansaço. O cansaço.
Fechar os olhos. E não ver.
Abri-los e continuar cega.
Se pudesse, se soubesse, juro-te que apagava. Arrancava. Vomitava. Cuspia. Matava.
Esquecia.
Mas não posso.
Nem quero.
Quero olhar-te. Quero ver-te. Ver-me.
Sem ter de me esconder.
Estive lá, estes anos todos, escondida dentro daquele espelho, naquele quarto.
Aquele quarto que já não existe.

Sem comentários: