Cala-te 3

Mas do que não pode mesmo falar é da lixeira de resíduos tóxicos em que se transformou a cave da tua casa, do fedor que dela emana, do nariz dos vizinhos sempre prontos a apontarem o dedo, ou talvez isto já seja a tua paranóia e afinal o indicador seja teu, a vergonha pelo estado a que as coisas chegaram, a impotência perante os danos estruturais e colaterais, o desespero pela vida das espécies que sentes ameaçadas, e a inabilidade geral para desenrolar um plano eficaz de acção. Aliás, o estado da coisa é tal que nenhuma acção propriamente dita poderá alterá-lo, a não ser que englobe restruturações profundas nos alicerces e nas vigas mestras do edifício. A cave é, como se sabe, o sítio onde assenta toda a fundamentação de uma construção, e, apesar da boa qualidade dos materiais, o lixo atingiu proporções tais, a sua virulência tóxica níveis tão elevados que, com o tempo, se arruinaram as estruturas principais e contaminaram os lençóis de água subterrâneos. Isso, tem paciência, é que não. Ninguém aguenta conversa de caca.