quinta-feira, janeiro 20, 2011

Catálogo de dores

Há vários tipos de dores. Poderíamos utilizar diversas classificações, aliás. Há dores agudas, dores quentes, frias, pontiagudas. Há dores fininhas e dores largas. Há dores silenciosas e outras que se ouvem a quilómetros. Há dores cortantes e dores que estrangulam, e outras há que afagam e consolam. Há dores azedas, salgadas, irritantes, calmantes e até doces. Há dores que nos acordam, outras que nos adormecem. Há dores que queimam. Outras que lavam. E também as há corrosivas, como os ácidos. Há dores que nos lembram que existimos e outras que nos matam. Há dores que nos beijam e abraçam o corpo, e outras que o mutilam e dilaceram. Há dores que nos humilham e enxovalham, há dores que nos massacram; outras há de que nem sentimos o toque, apenas um ligeiro ardor. Podemos pensar em alguns exemplos, também. As dores de dentes, tão agudas e certeiras. As dores de costas, quentes, largas, ou curtas, bicudas. As dores de cabeça, apertadas, como alfinetadas; persistentes, quase mudas. As dores de parto, intensas, gritantes, que nos acordam o corpo para o que é necessário. As dores no peito, agulhas ansiosas como asas a quererem romper. As dores de garganta, ácidas, como lâminas afiadas e vermelhas, congestionadas. Dores doces, aconchegantes, só me lembro das causadas pela saudade; pela falta de algo que sabemos nosso mas que já não podemos ver. Dores mansinhas, de antigas dores que foram sendo acarinhadas, como filhos no regaço. Dores de alma que aos poucos sucumbiram, até só restar a mágoa, que é como uma água morna que lava a dor. Todas elas doem, umas mais, outras menos. Há depois as dores que não podemos sentir, e por isso ignoramos e esquecemos. E essas, digo-vos eu, são as piores.

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