terça-feira, março 01, 2011

Publiquei este texto há um ano, e hoje volto a publicá-lo

porque sim. Porque eu sou mesmo assim, agarrada às datas. E porque hoje, este gesto, está mais do que nunca inteiro.

Às vezes é apenas um gesto. Outras, um olhar. Às vezes a corda parte-se. Não sabemos atá-la de novo. Não sabemos nada. Andamos à deriva sem conhecer o fundo do rio. Às vezes é uma palavra, aquela pequena palavra que encontrou morada dentro de nós, e nunca cresceu. Ficou atrofiada. Paralisada. Às vezes perdemos o fio. O rumo. Ou encontramo-lo sem procurar. A busca desvia-nos do norte. Perdemo-nos. Às vezes é um rosto. Uma memória. Uma voz. Uma caixa de música. De outras vezes é o silêncio. O mais absoluto silêncio que diz aquilo que não dizemos. Aquilo que não sabemos dizer.
Às vezes é o sangue. A dor. A raiva. Às vezes a corda aperta, aperta, aperta. Não conseguimos respirar. Às vezes renascemos. Sem braços nem pernas mas com o coração a transbordar. O coração sabe. O coração sente.

Às vezes é um nome. Uma frase. Olharmos o espelho e reconhecermos o rosto. Os olhos. A boca. Esta sou eu. Quem sou? Nada do que a imagem reflete, tudo o que ela guarda. Imagino que seja isso que um alcóolico sente, quando vai a uma reunião dos AA e pela primeira vez se apresenta. Fulano de tal. O nome não chega. O nome seguido daquela frase. Sou um alcóolico. Apenas uma afirmação. Sou. Alcóolico. Sou dependente do álcool. Tenho um problema. Preciso de ajuda. Só.

Às vezes é o que fica por dizer. A maré imensa que sobe e nos afoga a garganta na enxurrada de lágrimas. Às vezes é o sol que nos bate nos olhos e seca essa fonte. Às vezes é a mão que se estende e o lenço para enxugar as lágrimas. E o olhar que se evita por pudor. O olhar onde se lê o que não se diz. Apenas. Um gesto.

Este gesto.


(Para a Cláudia, ela sabe porquê.)

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