quarta-feira, maio 11, 2011
Desilusão é o contrário de ilusão. Desistir é o contrário de existir? E descrever é o contrário de escrever?
Que horror, pensou, ao acabar de ler o que escrevera. Como é que é possível? Estava ali, esparramada no lodo, completamente nua, dissecada nas palavras, nas sílabas, nas orações subordinadas, coordenadas, apelativas, ou simplesmente ajoelhadas. Caramba, pensou. Não quero ser dessas malucas que escrevem blogues como quem vai ao psicanalista; não, eu quero escrever estórias, inventar personagens, criar enredos! Ficção, literatura; chamem-lhe o que quiserem; ai a minha vida! Espera, tu ainda não tinhas percebido isso? Tu que escreves quase desde que te lembras? Desde que aprendeste a escrever, pelo menos... Ai não? Antes também? Quê? Escrevias na tua cabeça? Boa, essa nunca tinha ouvido. Então e agora é que percebeste isto, ou estás outra vez a gozar? Estás a armar, não é? Pois, mais uma das tuas estórias, dos teus retratos ficcionados, das invenções com que vestes as palavras, convencida de que assim ninguém vê o que está por detrás; a nudez, a tua nudez, qual a das palavras! Tu, que até podias ser psicanalista, se não tivesses deixado a tua análise ainda antes mesmo de ela começar, ainda não tinhas percebido? Escreve mas é, mergulha de cabeça na associação e dissociação livre, construção e reconstrução onírica, integração e desconjunção do pensamento, expansão e contração corporais e mentais. Anda, deixa-te de merdas; sempre é mais barato que o psicanalista.
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