quinta-feira, agosto 11, 2011

Outra palavra séria

Anda para aí uma mensagem a circular no Facebook, dirigida aos principais responsáveis por estes distúrbios violentos nas ruas do Reino Unido, e que diz qualquer coisa do género: se querem ser homens e lutar a sério, alistem-se no exército e vão para o Afeganistão lutar numa guerra a sério, isto misturado com algumas palavras menos simpáticas ( u wanna be big men and fight to the death , well get your sorry little arses on the next plane to Afghanistan and stand alongside real men , they're called soldiers and they are fighting a war, unlike you bunch of pathetic wastes of space !!).

Apesar de esta mensagem me provocar alguma simpatia à primeira leitura, uma simpatia que nasce do repúdio por estes actos, não deixa de me provocar uma certa apreensão à segunda. Gostaria de partilhar esta minha apreensão, e para isso é preciso que pensemos com muito cuidado no que esta mensagem realmente diz.

Na minha opinião, os cenários destes distúrbios dramáticos são uma amostra muitíssimo reduzida do que uma população local enfrenta num cenário de guerra, uma população que é em tudo inocente e composta por pessoas dignas e trabalhadoras como o são as ruas de Londres e de qualquer cidade do mundo. A guerra é uma das coisas mais abomináveis a acontecer todos os dias em locais distantes, e o que é mais dramático é que num cenário de guerra os actos de violência (mesmo aqueles muito mais graves do que os que vimos acontecerem nas nossas ruas) são completamente impunes. Aliás, é esse o objectivo de uma guerra, destruir, eliminar, matar.

O que esta mensagem diz nas entrelinhas é o seguinte: se estes jovens querem causar distúrbios, partir montras, pegar fogo a casas e carros, que o vão fazer para longe, para outras ruas, onde deixarão de ser considerados arruaceiros e criminosos para passarem a homens a sério, cujas acções serão então justificáveis e até desejáveis, uma vez integradas num cenário de guerra, uma guerra que não é mais do que uma violência atroz, mas desta vez justificável por uma causa séria e global, como o combate ao terrorismo, ou outra qualquer. O que esta mensagem no fundo sugere é que o que andamos a ouvir os nossos políticos e jornalistas e analistas dizer, que nada pode justificar e desculpar estes actos de violência, é mentira, ou antes, não é absolutamente verdade; a mesma violência torna-se desculpável e aceitável se praticada num país remoto em guerra, contra populações em tudo igual à nossa.

O que é dramático é que os exércitos estão pejados de indivíduos com graves distúrbios psicológicos, problemas de agressividade, ausência de remorso ou culpabilidade pelas suas acções, iguaizinhos aos que vemos nestes jovens e nestas crianças que se divertem a partir montras e a destruir comunidades. E o que é grave é que estas característcas psicopatológicas tornam-se aceitáveis e até desejáveis nesse contexto. Quem não se lembra daquele vídeo que mostrava comandos de um helicópetro a bombardear pessoas na rua de uma cidade em ruínas de guerra, como se fosse um jogo, por entre gargalhadas e palavras jocosas?

O que estamos a dizer nesta mensagem é que só não aceitamos esta violência se for na nossa rua, na nossa cidade, no nosso país, no nosso mundo. Mas se for suficientemente longe, num país em guerra, encolhemos os ombros e acenamos com a cabeça. E nem sequer perdemos tempo a pensar nas vítimas inocentes.

Há quem pense que a humanidade evoluirá no dia em que não houver mais doenças incuráveis, ou injustiça, ou miséria, a lista pode ser interminável. Eu também concordo, mas para mim, no dia em que não precisarmos de exércitos, aí sim, daremos um passo gigante na evolução.

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