sábado, setembro 17, 2005

FAR FAR AWAY

Isto de estar longe e falar com as pessoas através de uma máquina tem muito que se lhe diga. Pode parecer estranho, mas sinto-me mais próxima dos meus amigos aqui, a milhares de quilómetros de distância, do que alguma vez me senti estando lá, perto deles. Ou melhor, não é que me sinta mais próxima, a verdade é outra, é um sentimento novo, difícil de definir. Aqui, a milhares de quilómetros, sinto de uma forma completamente diferente a falta das pessoas. É como se desse um valor diferente às coisas, como se as palavras e a amizade ganhassem uma dimensão nova. Às vezes é preciso realmente distanciarmo-nos das coisas para as saber olhar e apreciar. Nunca me esqueço da verdade de tais palavras: o amor não existe sem distância. Se não houvesse distância entre as pessoas, não seria possível definirmos os nossos contrornos, limites, aquilo que nos diferencia dos outros - e não seria possível amar ninguém, porque o amor pressupõe sempre a existência de um outro, alguém exterior a nós, diferente de nós, afastado de nós.

Mas já me estou a perder. E no fundo tem tudo a ver com o que eu disse. É que agora estou distante, mas ao mesmo tempo estou perto. É que as pessoas podem estar muito longe fisicamente mas muito perto no coração. E isso é uma verdade que toda a gente sabe mas que ganha todo o sentido quando se experimenta. Não é preciso estarmos sempre colados uns aos outros, porque estamos sempre perto de quem realmente gostamos. E esta capacidade de nos afastarmos e de levarmos connosco aqueles que amamos também é indispensável à vida. É isso que o bebé aprende quando se afasta progressivamente da mãe e a ela retorna, num jogo de esconde e encontro repetido até se firmar dentro dele a certeza de que a mãe não desaparece, não morre, quando ele não a vê.

Lá me estou outra vez a perder. É que depois há esta máquina, o computador, e a internet, e o blogue, enfim, estes esquemas que inventamos para estarmos mais perto uns dos outros, um pouco artificiais porque de facto não estamos, mas estamos... é um pouco confuso, de facto. O que eu queria dizer é que eu, que nunca gostei muito de contactar com as pessoas através desta máquina, de há uns meses para cá que não faço outra coisa senão escrever, ler blogues alheios, fazer comentários mais sérios e menos sérios, enfim, tornei-me uma adicta! E às vezes é mesmo só para estar aqui um bocado desligada da realidade (da realidade de mãe sempre a tomar conta dos rebentos, sempre a cuidar da casa, sempre a fazer almoços e jantares, enfim...), e é mesmo um filme, porque tenho de escrever com o Diogo quase a trepar por mim acima (O bebé quéli colo!) ou com o David aos gritos (Ó mãe, já viste aquilo? Ó mãe, olha para mim!), mas eu lá continuo, enquanto à minha volta voam gritos de protesto e outros objectos estranhos, com uma sensação furiosa a comandar os meus dedos numa agilidade surda, caraças, deixem-me em paz, deixem-me escrever, deixem-me estar aqui um bocadinho a curtir o meu vício que eu também não vos chateio quando estão a brincar!

E através deste fio de palavras tenho falado com amigos distantes, mais do que se calhar quando vivia lá ao lado deles. Tenho uma velha amiga com quem restabeleci contacto através do blogue.Tenho uma nova amiga que conheci lá não como amiga mas que depois de alguns mails e comentários e fotografias trocadas já trato por tu e já chamo de amiga. Tenho de repente pessoas que não conheço a mandar-me mails e a deixar comentários que me fazem rir e sentir uma vibração estranha no peito. E tenho os meus velhos amigos, alguns que até revi quando fui a Portugal, cada vez mais perto, dentro do coração, alguns mails trocados (mas nem muitos), porque são aqueles para quem não é preciso palavras nem presenças para saber que estão aqui.

No fundo esta vida é uma merda, e cabe-nos a nós torná-la mais viva. Desculpamo-nos com a falta de tempo (e é mesmo verdade, o tempo foge-nos) e passam-se anos às vezes sem vermos os amigos que moram ao nosso lado. Lembro-me de em adolescente achar que nunca seria assim comigo. Mas cresci e tornei-me também assim, com a diferença de que não gosto de ser assim. Acho que ninguém gosta. Acho que todos nós, se pudéssemos, teríamos tempo de sobra para estarmos com os nossos amigos. Mas não temos. A vida empurra-nos constantemente e nós não conseguimos desdobrar os momentos. E às vezes passam-se anos. Só que quando moramos ao lado dos nossos amigos, sentimos que eles estão ali ao alcance da nossa mão, basta um telefonema para lhes ouvir a voz, e adormecemos nessa sensação de que amanhã, ou qualquer dia, havemos de os ver. Quando estamos longe sabemos que estamos longe, que não basta um telefonema, que não nos podemos ver, a e distância ganha outro peso. E por isso passamos a dar outro valor a tudo o que nos possa aproximar. Abrimos o email ansiosos de encontrar notícias, mandamos cartas pelo correio, ficamos à espera de meia dúzia de palavras que têm o sabor e o brilho da saudade. Saudades deles, mas nossas também, desse outro tempo em que tinhamos tempo para quase tudo o que queríamos e que não volta mais. Relemos cartas e textos antigos e viajamos até eles, até àquele tempo, e ficamos suspensos no ar, no céu, nas nuvens, a sentir os raios de sol do que passou e nos une para sempre. E depois acordamos hoje, aqui, agora, sem tempo para nada mas com todo o espaço do nosso coração para eles. Os nossos amigos.

2 comentários:

Anónimo disse...

Olá,sou a Dulce e estou a viver na Bélgica à dois anos e meio, e este seu post foi-me roubado do fundo do coração,tinha a sensação de ter sido eu a escrevê-lo!!!!
Parabéns!
Descobri por acaso o seu blog e se permitir vou passar a visità-lo quando puder...
beijos

papu disse...

Está à vontade!!!
:)
(Também me podes tratar por tu, claro!)