domingo, outubro 29, 2006

ÀS VOLTAS COM O TEMPO

Hoje ando às voltas com a mudança da hora. Acho que o tempo me pregou uma partida. Ainda me lembro de, há cerca de três décadas atrás, ter intuído que ele, o tempo, me andava a enganar. Foi depois do Natal, na cozinha da minha avó, decerto durante os preparativos para a festa da passagem de ano. Lembro-me que a Mariana estava a fazer rissóis. A Mariana era a senhora que trabalhava em casa da minha avó, mas para mim era mais que isso, era mais uma pessoa da família, de parentesco desconhecido mas acolhido no meu universo de 6 anos. Era, além disso, mãe da minha melhor amiga da altura, a Ló. A Ló era mais velha do que eu, para aí uns três ou quatro anos, e pesava sobre os seus ombros o estigma de atrasada, porque tinha péssimas notas e repetira o mesmo ano várias vezes, o que para a minha família alargada de gente ligada ao ensino era inadmissível e só podia significar que era burra. Mas era a minha companheira de brincadeiras favorita.

Mas estava a falar do tempo... Ah! Sim, estava a ver a Mariana a estender a massa com o rolo, a dispôr as bolinhas de recheio em cima da massa, afastadas por alguns centímetros umas das outras, depois dobrava a parte inferior da massa por cima das bolinhas, e com um copo cortava os rissóis, para lhes dar a forma redonda. Eu podia ficar uma tarde inteira a observá-la nesta tarefa que não me cansava. E devo ter-me queixado de que o Natal já acabara, e que mal podia esperar pelo próximo, que para mim nem se avistava ainda ao longe da estrada interminável que naquela altura o espaço de um ano representava. Ao que ela respondeu, distraidamente, e sem desviar os olhos do que fazia:

«Ah! Tarda nada já está ele aí outra vez, deixa lá!»
«Mas não é este que passou, é o próximo!» insisti, pensando que ela só poderia ter percebido mal.
«Sim, então, passa num instante!»
« Num instante? Mas ainda falta um ano!»
«Ora, e um ano não passa num instante? Isto agora daqui até ao próximo Natal é um instante!»

Nesse dia lembro-me de achar que ela só podia ter batido com a cabeça. O pior é que acho que todos acabamos por bater com ela no mesmo sítio. Pois é.

6 comentários:

José Antunes Ribeiro disse...

Papu, bom dia!
Ando por aqui, solidário e silencioso, como é meu dever, queria, no entanto dizer-lhe que fui ao "O Outro Lado da Lua" e adorei os seus poemas, a sensibilidade, o silêncio que respiramos...
Pois é, tantas vezes tenho escrito isso,"o tempo é o grande inimigo"...tudo passa num instante, como dizia a Mariana, o Natal está aí novamente!
Um grande abraço! Até breve!

Alex disse...

Irrita-me quando ainda estamos em Agosto / Setembro e me dizem que não tarda nada estamos no Natal.

Fico louca quando vou com a minha filha na rua e me dizem que não tarda nada está uma mulherzinha e casada e eu com netos.

Fico doida varrida quando ainda estou em Novembro e me dizem que daqui a nada faço 40 anos!


hehehe


O tempo passa à velocidade que nós deixarmos. Mas assim, assim passa num ápice e não tarda nada estamos em Novembro de 2007!

Alex disse...

Passei para te desejar um bom fim de semana. Um beijo doce,

Alex disse...

Bom dia Papu!

Onde andas?

Anónimo disse...

É muito engraçado e terno ler estas histórias antigas da Mariana e da Ló...
Beijinhos
Pedro

T
Te
Tch
Tch
Tchanges
!!!!

Anónimo disse...

E o que será feito da Ló? Sabes alguma coisa fela? Já terá filhas/os casadoiros? Ainda ai pela internet a ver os teus blogs :-)
Já viste como a vida de pessoas que pareciam (aos nosssos olhos de míudos) irem ser obviamente iguiais - irem ter o mesmo fututro, tirar um curso superior (se é que pensávamos isso), etc - acabaram por ser tão condicionadas pelo meio em que nasceram?
Pedro