Hoje ando às voltas com a mudança da hora. Acho que o tempo me pregou uma partida. Ainda me lembro de, há cerca de três décadas atrás, ter intuído que ele, o tempo, me andava a enganar. Foi depois do Natal, na cozinha da minha avó, decerto durante os preparativos para a festa da passagem de ano. Lembro-me que a Mariana estava a fazer rissóis. A Mariana era a senhora que trabalhava em casa da minha avó, mas para mim era mais que isso, era mais uma pessoa da família, de parentesco desconhecido mas acolhido no meu universo de 6 anos. Era, além disso, mãe da minha melhor amiga da altura, a Ló. A Ló era mais velha do que eu, para aí uns três ou quatro anos, e pesava sobre os seus ombros o estigma de atrasada, porque tinha péssimas notas e repetira o mesmo ano várias vezes, o que para a minha família alargada de gente ligada ao ensino era inadmissível e só podia significar que era burra. Mas era a minha companheira de brincadeiras favorita.
Mas estava a falar do tempo... Ah! Sim, estava a ver a Mariana a estender a massa com o rolo, a dispôr as bolinhas de recheio em cima da massa, afastadas por alguns centímetros umas das outras, depois dobrava a parte inferior da massa por cima das bolinhas, e com um copo cortava os rissóis, para lhes dar a forma redonda. Eu podia ficar uma tarde inteira a observá-la nesta tarefa que não me cansava. E devo ter-me queixado de que o Natal já acabara, e que mal podia esperar pelo próximo, que para mim nem se avistava ainda ao longe da estrada interminável que naquela altura o espaço de um ano representava. Ao que ela respondeu, distraidamente, e sem desviar os olhos do que fazia:
«Ah! Tarda nada já está ele aí outra vez, deixa lá!»
«Mas não é este que passou, é o próximo!» insisti, pensando que ela só poderia ter percebido mal.
«Sim, então, passa num instante!»
« Num instante? Mas ainda falta um ano!»
«Ora, e um ano não passa num instante? Isto agora daqui até ao próximo Natal é um instante!»
Nesse dia lembro-me de achar que ela só podia ter batido com a cabeça. O pior é que acho que todos acabamos por bater com ela no mesmo sítio. Pois é.
6 comentários:
Papu, bom dia!
Ando por aqui, solidário e silencioso, como é meu dever, queria, no entanto dizer-lhe que fui ao "O Outro Lado da Lua" e adorei os seus poemas, a sensibilidade, o silêncio que respiramos...
Pois é, tantas vezes tenho escrito isso,"o tempo é o grande inimigo"...tudo passa num instante, como dizia a Mariana, o Natal está aí novamente!
Um grande abraço! Até breve!
Irrita-me quando ainda estamos em Agosto / Setembro e me dizem que não tarda nada estamos no Natal.
Fico louca quando vou com a minha filha na rua e me dizem que não tarda nada está uma mulherzinha e casada e eu com netos.
Fico doida varrida quando ainda estou em Novembro e me dizem que daqui a nada faço 40 anos!
hehehe
O tempo passa à velocidade que nós deixarmos. Mas assim, assim passa num ápice e não tarda nada estamos em Novembro de 2007!
Passei para te desejar um bom fim de semana. Um beijo doce,
Bom dia Papu!
Onde andas?
É muito engraçado e terno ler estas histórias antigas da Mariana e da Ló...
Beijinhos
Pedro
T
Te
Tch
Tch
Tchanges
!!!!
E o que será feito da Ló? Sabes alguma coisa fela? Já terá filhas/os casadoiros? Ainda ai pela internet a ver os teus blogs :-)
Já viste como a vida de pessoas que pareciam (aos nosssos olhos de míudos) irem ser obviamente iguiais - irem ter o mesmo fututro, tirar um curso superior (se é que pensávamos isso), etc - acabaram por ser tão condicionadas pelo meio em que nasceram?
Pedro
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