domingo, abril 01, 2007

Conversas, amizade, livros e arte


Fotos daqui


Desde que cheguei de Portugal, já há mais de um mês, que guardo numa gaveta, com muito cuidado, todas as palavras e sorrisos e cores trocadas à mesa de um café, onde nos esquecemos das horas e deixámos a conversa rolar. Pois bem, hoje resolvi abrir a gaveta, e deixar as palavras ganharem asas.

Voltar à minha velha amiga Ulmeiro teve o sabor de muitas e muitas recordações. Está bastante diferente desde a úlima vez que lá entrei, mas não mudou na essência. Os livros enchem as paredes (e o chão!) e são tantos, que lhes ouvimos as conversas distraídas. Outros chamam por nós, convidam-nos a entrar. Sim, é verdade, os livros falam connosco, das prateleiras.

Há quadros nas paredes, que também nos contam histórias. E se descermos à cave, por umas escadas apertadas, entramos noutro mundo de coisas antigas e cheias de memórias nas madeiras dos móveis e no brilho de loiças e vidros que reflectem o arco-íris de tempos esquecidos. E livros, claro. Muitos livros. Dezenas, centenas.

Apetece ficar ali uma tarde, ou um dia inteiro, a folhear páginas, algumas já amareladas, outras com a cor de muitas mãos e muitos olhares, a espreitar títulos em lombadas ocultas nas sombras das prateleiras, a sentir o cheiro de cada estória inventada, de cada história recontada. Já repararam que os livros têm um cheiro próprio? E já experimentaram cheirar aqueles livros que ainda retêm o mesmo cheiro de há vinte ou trinta anos? Não viajam no tempo? O cheiro dos livros guarda uma infinidade de memórias que julgávamos esquecidas, ou que nem sonhávamos ser possível voltar a sentir.

Mas o melhor que esta velha amiga me trouxe foram dois novos amigos: o José e a Lúcia. Com ela apenas trocámos algumas palavras e sorrisos, com ele passámos duas tardes inteiras na conversa, e acho que teríamos ficado mais tempo, não fossem as imposições horárias das nossas vidas a tomarem o comando. Falámos de tudo um pouco, de livros, do mundo, da vida, dos filhos (e dos netos) e acho que no fim ficámos com a sensação de que já nos conhecíamos de longa data. Do José, o que me ficou, foi a sua simplicidade, o sorriso contagiante, e esse brilho no olhar de quem já viveu muito e conserva consigo a alegria e o impulso da juventude.

Ficou também a vontade de voltar, e perder-me no meio dos livros e das recordações.

Um abraço aos dois :-)

5 comentários:

José Antunes Ribeiro disse...

Olá, Papu, Bom Dia:)

A vida às vezes é generosa connosco...i.é, os amigos são generosos!...
Também nós gostámos muito de os conhecer! Ao longo de todos estes anos criámos neste espaço muitas amizades...é talvez um dos aspectos mais gratificantes do nosso trabalho! Alguns estão aqui na blogosfera...outros aparecem...Infelizmente alguns já partiram!...Falo apenas no Zeca Afonso...visita habitual da livraria e da nossa casa!
Nesta altura aparecem com frequência o António Lobo Antunes e o Vitorino...quase todas as semanas! E outros menos mediáticos...muitos dizem que os livrámos do "psicanalista"!...
Estes espaços são insubstituíveis...Nenhuma modernização pode substituir o contacto humano, uma palavra de incentivo, um gesto, um sorriso...
Precisamos, de facto, de poucas coisas...
E quanto aos livros...estou inteiramente de acordo consigo! às vezes imagino a história de cada um deles...dentro da história que o livro nos conta...as várias leituras possíveis!...Esta , a vossa, chama-se AMIZADE e fica gravada no nosso coração...para os momentos em que precisamos de ir buscar forças suplementares...BEM HAJAM!

jlf disse...

Olá, Papu! (*)

"E para todos os que se quiserem juntar!"

Ora bem: cá estou.
O Zé Ribeiro nunca me enganou. Nem alguma vez me deu maus conselhos.
Se ele me falou da Papu... Lá tinha as suas razões. Que já descortinei:
a amizade, com raízes fundas, dura... Dura... Dura... (Como as pilhas duracell - que àparte mais bacoco!) Não há ciclone, tsunami ou terramoto que a derrube ou a abale.

Voltando à Ulmeiro (exacto: para mim também continua sempre a ULMEIRO - embora saiba que foi crismada), acho que a homengem é bem merecida.

Depois, há ainda outra coisa: a Papu domina muito bem o verbo. E com elegância...
Bem haja.

Como?
Se conheço o Zé Ribeiro e a Lúcia, se sou amigo deles há muito tempo?
Não! Nem por isso! Desde anteontem, há uns 36 anos. (Olhe, desde que a Papu e o meu filho mais velho nasceram... Por aí...)
Só que os dias esgueiram-se, pelas frinchas do tempo, num ápice.

Gostei de ter entrado.
Gostei muito do que vi e li.
Pelo que já tenho "visto" no "Voo da Coruja", a Papu é uma moça muito generosa.
Bem haja!
(Vá, deixe-me ser original [eh! Eh!]: disso, hoje já não se fabrica)

Fique bem.
Abraço
JL




(*) Eu que já fui (tive de ser) muito formal, adoro a liberdade e a informalidade que se cultiva na blogolândia.
É que eu também blogo.
Melhor dito: eu (des)blogo.
Eu não escrevo. Escrevinho umas coisecas. Cá continuo no meu exercício de solidão, parafraseando um amigo (que não conheço pessoalmente) que recentemente citei e comentei.

Mas qu'é lá isto?
Estamos aqui é para falar de si, do Zé Ribeiro e da Lúcia (da Manela também, é evidente).

Desculpe a "longuidão"!
JL

Manuel da Mata disse...

Olá Papu,

Os livros são tudo o que disse no seu texto. Mais o sortilégio de nos agarrarem para sempre.E a Livrarte é o que V. diz.

O meu primeiro livro - em minha casa não havia livros- foi-me oferecido por um padre e estava escrito em latim. Nunca o li, mas amei-o como uma verdadeira relíquia. Depois desapareceu, quando já tinha outros.

Hoje, tenho milhares de livros, que se riem para mim das estantes e que me interpelam e exigem que lhes pegue. Faço-o quase sempre com ternura. Não sei que influência terá tido o primeiro livro, em latim, que nunca li, neste meu afecto pelas palavras impressas e guardadas entre capas,que são uma parte não despicienda da minha vida.
Mas tudo isto vem a propósito da Ulmeiro e da Livrarte, que acompanho de há vinte e tal anos a esta parte. Ultimamente, tenho ido à Ulmeiro, digo, Livrarte, aos sábados à tarde, para dois dedos com o Zé Ribeiro e também com a Lúcia. Levo comigo, muitas vezes, uma cria de 26 anos, que já tem o bicho dos livros no sangue.Nunca regressamos de mãos a abanar.Vimos sempre mais ricos.E também mais felizes.

O Zé e a Lúcia merecem o seu texto.
Boa tarde, Papu!

Alex disse...

Mas que partilha tão boa esta.
Fico de coração nas mãos.

Não conheço o José pessoalmente mas a ideia que tenho dele, da sua entrega, é precisamente como o descreves.

Há pessoas que se cruzam no nosso caminho que nos ajudam a iluminar o sentido da vida.



Beijinho para ti Papu!

papu disse...

Olá a todos :)
Em especial ao Zé e aos seus amigos: muito obrigada pelas vossas palavras.

BEM HAJAM, como costumam dizer ;)