sexta-feira, janeiro 30, 2009

Pastéis de belém

Hoje, depois de nadar, fui até ao bar. Bebi um chá de framboesa morno e comi um pastel de nata. Eu não consigo beber chá quente, e geralmente as pessoas olham-me com surpresa quando lhes peço que ponham metade de água quente e metade de água fria na chávena. Quanto aos pastéis de nata, são fresquinhos e saborosos. Também vendem croissants e bolas de berlim. Lembrava-me vagamente da história que o homem atrás do balcão me contara há um tempo atrás, do empregado português que lhe ensinara a fazer aqueles bolos. Mas não tinha bem a certeza, por isso resolvi perguntar-lhe outra vez. Ele respondeu-me que os encomenda a uma confeitaria local. Fiquei desapontada. Provavelmente imaginei aquele enredo, mas ao menos era bem mais interessante. Provavelmente, também, é por causa disso - da minha imaginação - que a minha memória não é lá muito boa para guardar as histórias que oiço. Se calhar até nem as chego a ouvir de facto - invento-as. Sentei-me a uma das mesas a beberricar o chá e a comer o pastel de nata coberto com canela. Para dizer a verdade, nunca fui grande apreciadora de pastéis de nata. Mas estes sabem bem, e trazem-me memórias à boca. Talvez seja esse o sabor que procuro, o das memórias. Honra seja feita, porém, aos pastéis de belém. Os melhores pastéis de lisboa, portugal, mundo e arredores, costumava dizer o meu amigo Rui Parente. Ou talvez não fosse bem isso que ele dizia, e eu esteja agora a inventar - a recordar - as suas palavras. Íamos muitas vezes aos pastéis de belém. Sentávamo-nos sempre à mesma mesa - a que fica junto da porta, naquele corredor paralelo ao átrio principal. Aquela era a mesa dele. Desde criança que se sentava àquela mesa, quando lá ia com o pai e a irmã. Depois contava uma história qualquer acerca dos azulejos gastos e azuis das paredes, de que já não me lembro. Desta não me lembro mesmo, de maneira que não consigo reinventá-la. Os olhos dele também eram azuis. Porém, não guardavam nenhuma frieza, como a maioria dos olhos azuis que conheço. Neles não se reflectia o céu, mas o mar. Eu invejava-lhe a calma e a tranquilidade aparentes. Invejava, sobretudo, a sua capacidade de ficar em silêncio sem constrangimentos. Era capaz de ficar uma tarde inteira sem abrir a boca, se não estivesse para aí virado. Não falava para fazer conversa, ou para quebrar o silêncio. Porém, quando estava bem disposto, era daquelas pessoas que fazem rir o mundo à sua volta. Acho que, a dada altura, cheguei a apaixonar-me por ele. Aliás, acho que me apaixonava por todos aqueles com quem me identificava, naquela altura. Lembro-me muitas vezes dele e daqueles olhos de onde via espreitar o mar. Éramos da mesma idade. Uma idade eterna. Exactamente uma semana depois de fazer vinte anos, estava morto. Nunca cheguei a saber o que aconteceu naquela maldita noite, nem quero saber. 

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