quarta-feira, agosto 31, 2011

Posso imaginar?

Imagino um prédio alto, de muitos andares, e uma janela ampla, a vista cainda sobre a grande cidade, lá em baixo. Imagino um céu de nuvens baixas, cinzentas, um bailado de cambiantes do branco ao negro, ao sabor da luz que a chuva arrasta no seu rumor. Imagino as gotas de água desenhando rios na janela. Imagino o ruído da chuva a bater no vidro. Imagino alguns relâmpagos ao longe, fulgurações distantes. Imagino a cidade apenas iluminada pela luz quase morta das nuvens, a mesma luz que se acende em repentinos clarões quando as nuvens se definham em prantos. Imagino o silêncio do quarto povoado de ruídos e a luz a escorrer nas paredes frias. Imagino o espaço a dilatar e a encolher consoante o teu olhar viaja ou repousa, distraído. Imagino a água da chuva a brilhar-te na íris, e a trazer-te de volta céus distantes encharcados de uma outra chuva, aquela que traz a essência da própria luz. Imagino uma criança correndo para apanhar a chuva, ou fugindo dela, como num jogo de apanhada, e isto faz-me lembrar a história de um amigo meu que, quando ia para casa, de madrugada, depois das noitadas com o grupo de amigos, corria atrás da noite, porque o romper do dia quase sempre o apanhava a meio do trajeto, e ele precisava de se deitar com a escuridão para poder dormir. E então, contava ele, fazia o caminho quase a correr, porque o dia vinha atrás de si e ele não podia deixar escapar a noite. E nós, claro, ríamos.

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