terça-feira, fevereiro 28, 2006
OLHA QUE COISA MAIS LINDA
É verdade, um pãozinho, alentejaninho, deliciosinho, hum hum hum!
E mais deliciosa ainda vai ser a açorda alentejana que eu vou jantar! Eheh...
E tudo graças à minha amiga Graciete, que é uma querida e me trouxe esta preciosidade... Muitos beijinhos! Estou desejosa de te rever! :)
...
Quando começo a picar os coentros, até formarem uma pasta, misturados com o sal, em cima da uma tábua e com o auxílio de uma faca, porque aqui não tenho gral, já não estou aqui. O cheiro picante e familiar entrou-me pelas narinas e transpostou-me para longe, muito longe, directamente para o passado.
Para a cozinha grande e quente da minha avó.
Em cima da mesa de pedra está um gral cheio de coentros, e alguém está a pisá-los, com força, e o cheiro invade todo o espaço. As panelas fumegam ao lume, e o pão aguarda em cima da tábua para ser cortado.
Depois vejo-me à mesa, a açorda a chegar dentro de uma tijela enorme de vidro, e o cheiro dos coentros, sempre o mesmo cheiro, o sabor do pão encharcado no caldo quente da sopa. Uma delícia.
Vejo o meu avô, ao meu lado, comia sempre a fruta antes das refeições. E nós acompanhávamos esse hábito, e digo-vos, sabia muito melhor, começar o almoço pela fruta.
Vejo a minha avó a trazer um prato de figos para a mesa. Figos do Pinote...
Se fechar os olhos outra vez estou em casa da Natália, vejo o Aníbal na cozinha de volta dos tachos e das panelas, e no ar mais uma vez o cheiro dos coentros, e de outras coisas deliciosas que ele cozinhava. Na sua casa, era ele o cozinheiro. Nas suas mãos, a comida ganhava outro sabor, outro calor, único.
Lembro-me da Feira do Artesanato de Estremoz, e da 1ª Cozinha dos Ganhões. Lembro-me do calor tórrido que ali passei, debaixo de uma das barracas da feira (47ºC à sombra, meus filhos, não era brincadeira), da sensação de estar a assar às 2 da tarde, do duche de água quase fria que tomava antes de me deitar, da impossibilidade de dormir por causa do calor e das melgas.
E lembro-me das grandes tijelas de barro, cheias até acima, que nos traziam para a mesa, a fumegar, sopa de cação, açorda, sopa da panela... E nós devorávamos tudo, estávamos naquela idade em que o estômago cresce e parece que não tem fim... As mesas ficavam debaixo de um toldo de palhinhas, e o fresco da noite batia-nos na cara, numa carícia, era a única hora em que o calor dava tréguas e podíamos enfim respirar de alívio. E que fome que tínhamos...
E tudo por causa deste cheiro dos coentros, que sempre me faz recuar no tempo e saborear saudades em cada colherada desta açorda. Claro que a minha não sabe tão bem como as outras, as que comi há tanto tempo, as que ainda como às vezes em casa da minha mãe, mas dá para matá-las. Às saudades.
segunda-feira, fevereiro 27, 2006
O DIOGO JÁ ANDA SOZINHO!!!
Às vezes cai, e o meu coração dispara no peito. Mas nada de grave, daí a pouco levanta-se e continua o seu percurso, todo contente: "Mãe, eu conxigui! Mamã, eu conxigui!"
Fico a olhar para ele, com um sorriso de espanto, sempre atenta às quedas, parva de felicidade.
Tenho de preparar o meu coração para, quando ele tirar o gesso, para os saltos que aí vêm. Ai. Nem quero pensar.
AAATCHIIIIM!!!
Puquê eu espirrei?
Puquê o espirro quia xaíl?
Eu não quélo qui o espirro xaíxe...
domingo, fevereiro 26, 2006
sábado, fevereiro 25, 2006
ESTA QUESTÃO DA RAÇA
Desde os tempos em que estudava Biologia na escola secundária, e me apercebi da inconsistência do conceito de "raça".
Desde as leituras de "O Macaco Nu" e "O Zoo Humano", de Desmond Morris, que trouxeram novas luzes, cores e perspectivas aos meus olhos.
Mas desde que sou mãe de dois cabritos, esta questão passou a fazer parte da minha vivência.
Para quem não sabe, cabrito é o nome que se dá ao ser humano resultante do cruzamento entre um branco (indivíduo de raça branca) e um mulato (indivíduo de raça mista, resultante por sua vez do cruzamento entre um indivíduo de raça branca e outro de raça negra).
Ora, o que me tenho apercebido, é que para além do racismo e da xenofobia existentes (quadros compulsivos mais graves), existem uma série de preconceitos raciais inerentes a esta questão, que estão tão enraizados na cabeça das pessoas como as ervas daninhas nos canteiros, e que, se não matam, moem, incomodam, provocam constrangimento.
Quando o David nasceu, ouvi coisas tão díspares como: "ele é mesmo preto!", "mas ele é muito branquinho!" (o espanto a crescer na voz. E a dúvida traiçoeira: "acho que ele é branquinho demais...", num tom irónico, de evidente brincadeira, mas não menos despropósito).
Depois veio o Diogo, que é, incontestavelmente mais branco que o David, e que tem os cabelos muito mais claros que qualquer um de nós (eu incluída). E os comentários não se fizeram esperar:
- Ah, este é mais branquinho que o outro... sai mais a si! - um olhar de tentadora cumplicidade, e de um sorriso inequívoco a acompanhar.
- Mas ele é loiro... (espanto)
- Ele é muito clarinho, há aqui qualquer coisa de estranho... (risos)
A maior parte destes comentários foram feitos num tom amigável. Mas isso não lhes tira o carácter preconceituoso, ainda que não discriminatório. Aliás, o significado de preconceito vem de pré-conceito (ideia pré-formada, anterior à observação dos factos).
Porque é que ter a cor da pele diferente não é uma coisa tão natural como ter a cor dos olhos diferente ou o cabelo liso ou encaracolado? Ou ter sardas, ou ter nariz comprido ou achatado? Ou ter olhos pequenos ou grandes? Ou ser loiro ou moreno? Ou ter sangue do tipo O ou do tipo A?
E no entanto, a nível biológico, as diferenças genéticas são mais ou menos as mesmas, para um caso e para outro.
Estas perguntas podem parecer inocentes e ingénuas, mas não são. É, aliás, nelas que reside a complexidade da questão. Porque de facto ter a pele de cor diferente (ou ser de outra "raça") é a mesmíssima coisa que ter olhos azuis ou pretos. Que ter o cabelo liso ou encaracolado. Que ser Rh+ ou Rh- O resto, os preconceitos, nascem na cabeça das pessoas.
E para que conste:
Nem o Diogo sai à mãe por ser "branquinho"", nem o David sai ao pai por ser "escurinho". Os meus filhos saíram de mim, foram criados nas minhas estranhas, o seu sangue nasceu do meu sangue, são da minha raça. E eu da raça deles. Ainda que a pele deles fosse negra como o carvão e a minha branca como a neve, eles continuariam a ser da mesma raça que eu.
Porque a única "raça" a que pertencemos é a Raça Humana.
Porque, de "branco", só tenho mesmo a cor da pele.
sexta-feira, fevereiro 24, 2006
OS MEUS FILHOS
adoram passas. Acho graça, porque eu não sou grande amiga de passas, e em criança então, detestava.
Eles gostam tanto, que se eu não disser nada, devoram o pacote inteiro.
- Diogo, já chega de passas, já comeste muitas!
- Quem, eu? - pergunta ele com um ar muito espantado, para ganhar tempo.
- Sim, quem é que há-de ser?
- E uma? - insiste ele, a levar a mão à boca.
- Está bem, mas é só mais uma!
...
- Diogo, então? - pergunto ao ver a mão deslizar novamente para a boca.
- E uma?
- Isso foi há bocado, era a última, lembras-te?
- E outa uma?
quinta-feira, fevereiro 23, 2006
A VOZ QUE NÃO MORREU
Correndo o risco de estar, portanto, a ir contra as minhas próprias convicções (porque ainda penso da mesma maneira), não posso deixar passar em branco o dia de hoje. Hoje faz anos que esta voz se apagou. Mas não morreu. Continua viva nos ouvidos e no coração daqueles que a amaram e ainda amam. E recordo este dia, já não me lembro exactamente do ano, só sei que eu teria aí uns 16 ou 17. Ouvi a notícia na rádio, de manhã, antes de ir para a escola, e fiquei profundamente triste. Essa tristeza aumentou ao longo do dia. A voz dele na televisão e na rádio fez explodir as lágrimas e a revolta; caramba, é preciso morrer para finalmente ser ouvido em todo o lado! E quando cheguei a casa desabafei com o meu Diário. Já não me lembro exactamente do que escrevi, mas tenho a ideia ainda na cabeça. A alma dos grandes Homens não morre. A tua voz não morreu, Zeca! Ela está no coração dos que te ouvem e te recordam, está na rua, como a morte na canção que cantas.
quarta-feira, fevereiro 22, 2006
NÃO SABEM O GOZO QUE DÁ
Não sabem o gozo que dá!
Inspiramos fundo o ar gelado da manhã, e até parece que o cinzento melancólico do céu nos sorri, de olhos brilhantes.
LIVRO DE QUARTA
O livro dela que mais me tocou foi sem dúvida, este. Que mais me tocou e que mais me impressionou.
Escrito à cabeceira do leito de morte da própria filha, é, ao mesmo tempo, um desabafo sobre a ansiedade e o terror de toda a situação vivida, e um balanço de vida, do passado, da história pessoal e familiar.
Nunca alguém se expôs desta forma num livro. Talvez porque, no início, o intuito não era escrever um livro, mas sim devolver a memória à filha doente, quando esta estivesse recuperada.
É assim que o livro começa, mais ou menos: "Ouve, Paula, vou contar-te uma história, para que, quando acordares, não te sintas perdida." É uma dádiva à filha, mas também uma história que se conta na cabeceira de uma cama, esta, não antes de o sono vir, mas antes de a morte vir (o sono eterno).
E esta história transporta-nos para o coração desta mãe, para o seu presente e para o seu passado, para a sua alegria e para a sua tristeza, para toda uma vida subitamente estagnada e assombrada pela doença da filha. É um caminhar lento, um passo após o outro, por um atalho, onde o medo, a morte e a vida se entrecruzam até à loucura. É a súplica de uma mãe pela vida da filha, a esperança da saúde devolvida (e nós esperamos e ansiamos com ela, mesmo sabendo de antemão o desfecho trágico), a prece mais humilde e mais pura de um ser humano completamente à mercê do destino cruel, de uma chuva moribunda de que não consegue fugir nem abrigar-se. Uma a uma, geladas e fatais, as gotas de água encharcam-lhe o corpo desesperado e angustiado; uma a uma, as garras da loucura tomam conta da sua sanidade; uma a uma, as gotas de sangue da morte tingem o seu rosto pálido. É também a história de uma aceitação resignada, a princípio revolta e negação furiosas, mas que pouco a pouco vai adquirindo os contornos de uma tranquilidade sofrida, de uma paz triste de muitas lágrimas, de um consolo aflito como um abraço amigo.
Mas não se pense que é um livro mórbido, desamparado, deprimido. Não se pense que é um livro rasgado pela ansiedade e visitado pela melancolia. O livro não é sobre a morte; ou melhor, é também sobre a morte, mas é acima de tudo sobre a vida; o livro é cheio de vida, a vida que sofre, que chora, que desespera, que luta, que grita, que não se conforma, que sente a tristeza até ao limite, que busca um entendimento, que desiste, que vai ao fundo, que morre. O livro reúne todas as nossas lágrimas, possíveis e imaginadas. O livro retrata a emoção da vida, os caminhos, as curvas das estradas, os atalhos, os precipícios, os abismos. O livro é uma viagem ao inferno, ao inferno dos nossos medos mais terríveis; uma viagem que nos fortalece e nos acende novos sentires e novas incertezas. O livro abana os pilares da nossa existência como um terramoto, apaga-nos as luzes para que possamos ver com os olhos fechados aquilo que geralmente não está à luz nem à vista. O livro é um testemunho grandioso de uma alma que sente e que vive intensamente cada momento da vida como uma dádiva preciosa, e que mesmo dentro do poço escuro da perda mais terrível conseguiu sentir e fazer nascer em si a força necessária para ir ao fundo, bater no fundo e erguer-se. Mais triste, mais envelhecida, mais perdida, quebrada por dentro e sem esperança, mas mais sábia, mais sentida, mais viva, mais sofrida e mais forte.
Este livro faz-nos chorar e faz-nos rir, faz-nos sorrir e faz-nos explodir de dor, faz-nos vibrar, comove-nos profundamente, até ao âmago do nosso ser. E dá-nos também a nós, algo muito precioso: a possibilidade de nos confrontarmos com os nossos limites, com o nosso sofrimento, com o desespero, com o fim da vida. Faz-nos viajar dentro dos nossos sentidos, abre-nos a porta para a essência oculta da nossa vivência. É um livro que entra pelo corpo e pela alma e abala qualquer coisa dentro de nós. Depois de o lermos, não seremos mais os mesmos. Saímos da sua leitura com o espectro das cores afectivas mais alargado, com novas cores que desconhecíamos, cores invisíveis até olharmos nos olhos a verdade e a potencialidade do verdadeiro sofrimento. E crescemos por dentro, e aprendemos tanto, com esta história. Real.
domingo, fevereiro 19, 2006
A FESTA
Com 5 crianças cheias de vida.
Houve brincadeiras, gargalhada, algumas brigas, gritos... o costume.
O Diogo é que estava mais tímido: como ainda não se sente seguro não se atreveu muito a brincar junto com os outros no chão. E estava tão cansado que às tantas adormeceu. Ainda fez uma boa soneca, para aí uma hora e meia. Dormiu no meio da barulheira e dos gritos dos outros, encostado ao sofá, no meu colo!
Depois de despertar ficou mais bem disposto e lá foi brincar com os novos brinquedos para o chão.
Na hora de apagar as velas estava muito sério, a ouvir-nos cantar, e depois lá soprou, não foi à primeira mas foi à terceira! Apagou-as todas!
MUITOS ANOS DE VIDA, MEU AMOR!
3 ANOS
Depois de atravessado o túnel das dores, que se agigantam até ao insuportável, a recordação mais forte que tenho é aquele momento em que te colocaram em cima da minha barriga.
Minutos apenas, segundos talvez, que duraram uma eternidade.
E ficámos os dois tão quietos, no auscultar mútuo de pele e suores, no alívio e na carícia das dores, no sentir único do silêncio táctil da carne, na surpresa e no espanto da mistura das almas e dos líquidos, que a enfermeira até se espantou: "Então, não quer ver o seu bebé?"
Mas para quê olhar?
Se estávamos assim, colados, como se ainda nadasses dentro de mim, como se os nossos corpos fossem um só, como se da pele nascessem olhos e bocas e mãos que tudo vêem e sentem e partilham e abraçam, na paixão, no delírio, na ternura, na magia do toque, da sensação única de união.
Foram minutos, apenas. Segundos, talvez.
Eternos.
Meus.
E teus.
Nossos.
Só.
E quando por fim olhei o teu rosto pequenino
os olhos franzidos o nariz e a boca minúsculos
quando te toquei as mãos de dedos fininhos
quando te abracei com o olhar
senti enfim como esse olhar não basta
como se perde no espaço sem abraço que o sustenha
como o corpo grita de sede e pede a água que só a pele pode dar
o calor que só os braços apertados em redor de ti transbordam
a ternura que só o toque desperta
a alma de um amor que só a carne encerra.
sexta-feira, fevereiro 17, 2006
A PERNA AZUL
Já pode andar, embora ainda não se tenha atrevido a tal. O médico achou que ele já está bem, o gesso é mais para o impedir de fazer certos movimentos, como saltar e correr. Quando lhe tiraram o gesso anterior, começou a chorar e a dizer que lhe doía a perna; a enfermeira explicou que é normal, que a sensação é de choque, pois a perna esteve imobilizada e envolvida pelo gesso muito tempo, e quando se tira a pessoa sente um desconforto e uma estranheza enormes. Bem, quem já passou pela experiência deve saber, eu, como não fazia ideia, fiquei um pouco preocupada (pois estava à espera de uma sensação de alívio), mas a explicação da enfermeira foi suficiente para me acalmar de imediato.
Depois do choque inicial, foram só precisos uns minutos para que começasse a mexer a perna descontraidamente, como se estivesse bem de novo. A pele dele estava muitíssimo seca, debaixo do gesso, e ele estava cheio de comichões, de modo que passei o tempo a coçar-lhe a perna, com cuidado para não o arranhar.
Quando foi altura de por o novo gesso ele não achou graça nenhuma: desatou outra vez a chorar. Mas era mais de susto que de outra coisa. Agora está de novo sentado no sofá, ainda não quis experimentar levantar-se. Penso que ainda não está muito confiante; é uma questão de tempo.
Estamos todos mais calmos. O pior já passou, e tarda nada vai voltar a correr e a saltar por aí :)
quarta-feira, fevereiro 15, 2006
OS 101 DÁLMATAS E O SILÊNCIO DOS INOCENTES
Ora, estava eu ontem à noite na cozinha, quando sou surpreendida por um ladrar canino a rasgar o silêncio da noite. Parei imediatamente o que estava a fazer, e pus-me à escuta. Um cão a ladrar? Teria ouvido bem?
Da sala chegava-me o som da televisão, e de repente novo ladrar, mais forte que o anterior. Desta vez não tive dúvidas. Era mesmo um cão a ladrar!
E então?, estão vocês a pensar. O que é que um cão a ladrar tem assim de tão especial? Eu explico: sabem aqueles sons de fundo que não nos deixam usufruir do silêncio, que a gente às tantas confunde com o silêncio quase sem nos apercebermos, e que só damos por eles quando de repente cessam, sem motivo? E os nossos ouvidos, já habituados àquele ruído branco e monótono, de súbito estranham, e ouvem... o silêncio?
Pois bem, o ladrar do cão teve mais ou menos o mesmo efeito nos meus ouvidos e no meu cérebro. É que, quando o ouvi, estranhei... um som tão familiar na noite, era, subita e inexplicavelmente, completamente estranho... e porquê? Porque, simplesmente, deixara de os ouvir. E não me apercebera ainda. Como o ouvido acostumado ao ruído, que confunde com silêncio. Eu, foi mais ao contrário: confundi o silêncio com o ruído. O silêncio dos cães... ainda não tinha reparado nele, até àquele ladrar forte e inesperado.
É isso mesmo: os cães de Londres são inocentes silenciosos. Pura e simplesmente, não ladram. Mas como?, estão vocês agora a perguntarem-se. Good question. A mesma que fiz, incrédula, ao meu marido, quando vim até à sala confirmar que aquele ladrar só podia vir de um sítio... da televisão, e não da rua, como a princípio pensei! E fiz-lhe a mesma pergunta que agora levanto aqui: já reparaste que os cães daqui não ladram? Mas como é que isso é possível? É proibido? Mas e então, eles sabem disso?
E não pensem que não há cães: nunca vi tanto animal de estimação junto, nunca vi tantas senhoras gorduchas e homens pensativos e pessoas de todos os tipos a passearem os seus amiguinhos. Há cães de todos os tamanhos e feitios, de todas as raças e marcas de que se lembrarem. Mas não ladram. É verdade. Como é que isso é possível, não me perguntem.
Claro que um especialista em treino de animais com certeza que não achará espanto nenhum nesta minha questão. Mas para mim, permanece um mistério. Para mim, um cão a ladrar é a mesma coisa que um coração a bater. E se há quem diga que "cão que ladra não morde", para mim, cão que não ladra... não sei, parece-me menos cão, menos animal, como se lhe faltasse qualquer coisa.
OK, OK, não é nada agradável sermos acordados pelo ladrar destes amigos altas horas da noite, e prezo muito o sossego destas ruas... mas faz-me confusão aos nervos, o que é que querem? Desde ontem que não paro de pensar nisso. Nos cães sem voz. No silêncio destes inocentes.
Por isso é que vos digo que aquela cena dos 101 dálmatas não se pode ter passado aqui, nesta Londres, onde os canídeos são mudos. Aqui não foi de certeza. Ou foi pura imaginação,ou então foi antes do "latir" ser proibido nas ruas.
MAIS UM LIVRO
terça-feira, fevereiro 14, 2006
sábado, fevereiro 11, 2006
JOGO DE ESCONDIDAS
sumida
no canto do olho
na ânsia
no medo
no desejo
de apareceres
OS MIÚDOS REGRIDEM
- Queres fruta? A mãe corta.
- Queres leitinho? A mãe vai buscar.
- O que é que queres comer? Queres banana com iogurte? A mãe faz.
- Vá, come só um bocadinho. A mãe dá, queres?
- Queres que te dê a sopa?
- Queres uma palhinha? A mãe vai buscar.
E o resultado está à vista:
- Mãe, quero água!
- Eu tamém!
- Mãe, quero leite!
- Mãe, eu tamém quélo leite!
- Mãe, quero um bolicao!
- Eu tamém!
- Mãe, quero flocos dos teus sem leite!
- Mãe, eu tamém quélo flocos xem lête!
- ESPEREM UM BOCADO, SIM? OS MENINOS NÃO PODEM ESPERAR?
- David, tu podes levantar-te, o teu irmão é que não!!!
(Quem me manda a mim armar em super-mãe-omnipresente-super-protectora???)
sexta-feira, fevereiro 10, 2006
O DAVID ESTÁ A MELHORAR
O Diogo, por seu lado, está
tão rabujento
tão rabujento
tão rabujento
que não sei o que lhe faça!
(Tenho de lhe dar mimos, mimos, mimos!)
Depois o David (como já está melhor) não tem paciência nenhuma com ele!
(Mas ele no estado normal costuma ter uma paciência de santo, diga-se em nome da verdade!)
Com licença,
tenho de ir mimar o meu menininho!!!
(Eu quélo a mãe! Eu quélo a mãe!)
:(((
A consulta ficou adiada uma semana...
Disposição abaixo de zero...
Mas, valha-nos isso, está muito menos atacado que o irmão.
E com um verdadeiro ataque de mãezite aguda. Daqueles fortes.
Deixa lá ver se me consigo desdobrar em quatro braços (para dar conta de tudo), oito mãos (duas para mim e quatro para lhe fazer festinhas e tentar coçar a perna com uma agulha de tricot) e duas cabeças (uma para mim e outra para ele puxar os cabelos).
quinta-feira, fevereiro 09, 2006
PIOR
E logo amanhã que é dia de voltar ao Hospital e de (provavelmente) tirar o gesso!
quarta-feira, fevereiro 08, 2006
MAIS UM LIVRO À QUARTA
Bem, devo dizer que sou suspeita para falar deste livro. Não só por conhecer pessoalmente os autores, mas também por ter estado envolvida emocionalmente tanto na sua escrita como no seu lançamento.
Editado em 1997, já merecia uma nova edição, revista e aumentada, pois os Caminhos do Rap desde então não pararam de andar, e muito mais haveria para contar.
É um marco importante, dentro do contexto da cultura hip-hop em Portugal. Além de traçar a história do rap e movimento hip-hop no país e no mundo, procura mergulhar nas suas raízes, nos seus particularismos, na realidade urbana onde nasce e prospera, nos contrastes sociais gritantes que denuncia, na marginalidade de que é alvo, na mensagem de protesto tantas vezes presente e assente nas várias formas de discriminação, social, racial, sexual; na marginalização social; nos abusos de poder; na violência policial; na ferida gigantesca das injustiças de uma sociedade que está longe de ser pacífica, tolerante e respeitante das diferenças individuais.
O rap surge como um estilo de música controverso, incómodo, corrosivo na crítica cerrada que encerra, muitas vezes apelativo da revolta sangrenta e violenta contra a opressão maciça, um estilo que revolucionou o panorama musical da época em que nasceu e que rapidamente se espalhou pelos quatro cantos do Mundo. Tornou-se uma linguagem comum de pessoas de diferentes culturas, unidas pela mesma realidade de marginalidade e exclusão sociais. Deu voz ao "underground", um mundo abaixo do nível do socialmente correcto, um mundo que a sociedade repudia e tenta esconder, calar, ignorar. O rap tornou-se na voz de todos aqueles que estão descontentes, que não encontram lugar nesta sociedade, que se sentem à margem, que não se identificam, que não têm sentimento de pertença ao grupo social onde (não) estão inseridos.
É claro que depois evoluiu para outras realidades musicais. É nesta viagem que este livro nos faz embarcar: na procura do significado, no traçar das várias realidades contextuais, no sentir as batidas de um panorama musical conhecido pelo seu Ritmo e Poesia...
O livro reúne ainda os testemunhos de alguns rappers portugueses e de pessoas ligadas ao movimento e à cultura hip-hop. Conta também com a excelente colaboração fotográfica de Patrícia Almeida. Para os interessados, aqui fica um link com alguns excertos.
terça-feira, fevereiro 07, 2006
THE TRUE LOVE
Depois, anos passados, o namoro acabou. Imagino uma briga, uma cena de ciúmes, um mal entendido, desses que enchem os bolsos do passado dos namorados, e ficam para a posteridade a encher-lhes os cantos da casa de teias de aranha e a espalhar bocados de cotão debaixo dos móveis. O namoro acabou, mas não o amor. Nem a paixão. Ela continuava a pensar nele. E ele nela. Mas a briga - definitiva, como o são todas as brigas de fim de namoro nestas idades - permaneceu mais forte e ganhou raízes nos dois corações.
Entretanto, ela conheceu outro rapaz. Divertido, com sentido de humor. Sentia-se bem ao seu lado. Talvez a fizesse esquecer a chama da paixão que a devorava por dentro. Começaram a sair, um dia ele pediu-lhe namoro. E ela aceitou. Sem o coração aos saltos, mas com o pensamento a disparar fantasias.
Acabou por se casar com ele. Entretanto, ele - o outro, o seu amor - também casara com outra mulher. O despeito que sentiu foi abafado pela alegria de uma promessa de um futuro feliz ao lado do seu homem, o que escolhera para seu marido. E alegrou-se por pensar que também ele refazia a sua vida - e seria feliz.
Passaram-se anos. Muitos. Quase metade dos que já vivera. O seu casamento era insonso - o humor do marido rapidamente foi substituído por uma atitude distante, indiferente, contida. Não sentia a paixão que esperara sentir. E não parava de pensar que provavelmente cometera um erro. O outro, o seu amor, não lhe saía do pensamento. Nunca o esqueceu.
Passaram-se 10 anos. Ela entretanto divorciara-se ao fim dos primeiros cinco. A relação tornara-se insuportável para ambos. Do seu amor, nunca mais tivera notícias. Apenas sabia estava no Reino Unido, onde vivia com a família.
Um dia, ao chegar a casa, a mãe perguntou-lhe: "Adivinha quem te ligou". Ela não precisou de adivinhar; já sabia, pressentira-o. Fora ele. O seu amor. Ela já soubera que também ele se divorciara entretanto, e que do casamento havia um filho. Mas nunca mais se tinham visto, nunca mais se tinham procurado. Ele ligou novamente. Tinha regressado à China em trabalho, e disse que gostaria de a ver. Combinaram encontrar-se no dia seguinte.
Tinham passados 10 anos. Sem nenhum contacto. Mas ela sentia-se como se o tivesse visto ontem. O seu coração tremia e as lágrimas escorriam-lhe pelas faces enquanto esperava por ele, numa mesa de um café. Ao mesmo tempo, estava apertado de angústia: não o via há 10 anos! Como é que ele estaria? Teria mudado?
Quando, finalmente, ele apareceu, as lágrimas não pararam de jorrar dos seus belos olhos escuros. Ele, afinal, não mudara. Estava o mesmo. Assim como o que ela sentia por ele. Ao fim de tanto tempo, ainda o amava como no primeiro dia.
Conversaram durante um bom tempo. Contaram as histórias dos seus casamentos um ao outro. Riram como velhos amigos. No fim da noite, quando se sepraram, estavam ambos de coração apertado, e alma leve.
Ele regressou para a Inglaterra. E, ao fim de três meses, pelo aniversário dela, mandou-lhe um presente acompanhado de uma longa carta, onde dizia que ainda a amava, que durante todos aqueles anos nunca deixara de a amar.
Casaram então, apesar dos protestos dos pais, que achavam que era uma decisão errada, pois em dez anos as pessoas mudam muito, entre outros argumentos, cada um mais persuasivo que o outro. Mas eles não deram ouvidos a ninguém. O filho dele, então já com 18 anos, aceitou a situação. Hoje são muito felizes, e têm dois filhos.
Pronto, estão vocês a pensar. Deu-lhe para a veia romântica, e resolver inventar uma estória de amor completamente inverosímil. Enganam-se, meus amigos. Esta é uma história real: foi-me contada hoje, na primeira pessoa, à mesa do almoço, pela protagonista. E a adivinhar pelo brilho dos seus olhos, este amor, que sobreviveu a 10 anos de ausência e distância, ainda está vivo - e bem vivo. É evidente que floreei alguns pormenores (como compete aos contadores de histórias), mas o essencial está fiel. E olhem que, no fim, até eu tinha os olhos brilhantes - de lágrimas.
segunda-feira, fevereiro 06, 2006
domingo, fevereiro 05, 2006
HÁ UM MÊS
Há um mês que os dias são mais longos.
Há um mês que partilho o teu sono, lado a lado.
Há um mês que não grito para não correres nas escadas.
Para não saltares no sofá.
Para não me trepares para o colo quando estou no computador.
Para esperares por mim e me dares a mão.
Há um mês que não estou sempre a dizer-te para te levantares do chão.
E para não pores na boca as migalhinas que encontras na alcatifa.
Há um mês que não sinto os teus braços a apertarem as minhas pernas.
Há um mês que não te seguro no braço para te ajudar a saltar de um muro mais alto.
Há um mês que ficas o dia todo sentado, entregue a brincadeiras, tentando distrair o tempo.
Que mania esta minha de contar o tempo.
Há um mês que estou a contar os minutos de todos os dias.
E eles são longos, longos, longos.
Eternos.
Há um mês que vivo para um só dia, uma só imagem, um único pensamento.
O som e a alegria dos teus passos, misturados nos passos do tempo,
outra vez eterno de vida e movimento.
sábado, fevereiro 04, 2006
O AMOR (À FLOR DA PELE)
Sim, é possível acontecer.
Quem nunca recebeu amor não pode dar amor. Não sabe o que é o amor.
Quem dele só recebeu migalhas e restos, duvida da sua existência, desconfia da sua música, não crê nas suas palavras.
Quem o teve e o perdeu, vive na eterna nostalgia, na procura do afecto perdido. Mas essa busca é feita num registo infantil: não se cresce, não se desenvolve, não floresce em amor maduro. É um amor possessivo, egoísta, aglutinador.
As pessoas receiam queimar-se nas chamas do amor. A paixão assusta pelo que tem de impulso, de desejo de se fundir no outro. Mas se a estrutura da casa é sólida, não se afundará. Antes sairá fortalecida desse encontro: com uma nova energia e vitalidade.
Porque sem amor a vida não faz sentido.
Porque a paixão é o verdadeiro motor da nossa vontade, da nossa corporalidade, da nossa sensibilidade.
O DIOGO JÁ FALA INGLÊS
- Xaláp! (Esta foi a primeira que aprendeu)
- Às vezes substituída por: Xaláp you, bam bam!
- Cazy Fog (esta também foi das primeiras)
- Come backi! Come backi!
- One, two, thee, four, fivi, sixi...
- Jump! Jumpi!
- Come on!
- Stupid!
- Ei, man!
- Let's go!
- No way!
- Were-rabbit
- E depois, claro, diz o "hello", "bye-bye", mas só quando lhe apetece...
E diz mais coisas, agora é que não me lembro...
ESTOU-ME A PASSAR
E já fiz o upload da música duas vezes e ela continua a saltar... Grrrr...
É nestas alturas que me apetece mandar estas máquinas pela janela...
Olha, carreguem no play para ouvir a música que assim já não salta.
quinta-feira, fevereiro 02, 2006
DEVO ESTAR A ENLOUQUECER (SÓ PODE!)
Uma gaja, depois de emprenhar, perde completamente a sanidade mental e o bom senso. Senão vejamos:
- o rebento nasce. A gaja fica completamente agarrada àquela coisinha fofa e minúscula, que não lhe dá descanso as 24 horas do dia. Nos primeiros meses passa noites em claro, mal tem tempo para ir à casa de banho, não se penteia e anda de pijama o dia todo. Passa o dia a mudar fraldas, dar mama, ou então biberão, o que acarreta mais umas quantas actividades diárias: lavar, esterilizar, preparar o leite... Não sabe o que se passa no mundo nem no país, mas se lhe perguntarem quantas medidas de leite em pó são necessárias para preparar 270 ml de leite ela tem a resposta na ponta da língua.
- o rebento passa os dias a dormir, a mamar, a sorrir, a berrar a plenos pulmões, e a gaja passa o dia a fazer gugu-dádá, ou a cantar canções de embalar, ou a fazer massagens na barriga, ou a dar em maluca sem saber o que há-de fazer, a tentar adivinhar se o choro é por causa das cólicas ou da fome.
- e vem o dia em que alguém de alma boa e nobre coração se compadece do estado de desleixo e cansaço visíveis da gaja (a mãe, ou a sogra, ou uma amiga ou vizinha) e diz: vá, vai lá ao cinema com o teu marido, que eu fico com ele! Abençoada! E lá vão eles os dois, a gaja mais o seu gajo, enfiarem-se numa sala às escuras, para ver o filme que há tanto tempo queriam ver, ou não, também podem aproveitar a escuridão para uns amassos, como no tempo do liceu.
- 1º sinal de alarme: mal saem da porta, entram no carro (ou no autocarro, para o caso não interessa muito), diz ela com a ansiedade mal escondida na voz: "e se ligássemos para casa?", ao que ele responde: "para quê?", "é que agora é que me lembrei que me esqueci de...", o que vem a seguir não interessa, porque é quase sempre uma desculpa esfarrapada, o que a gaja está é a passar-se, uns minutos sem o seu rebento e a garra da angústia na garganta, lá telefona, "então está tudo bem? Ele já bebeu o leite todo? Ah, já está a dormir? E não chorou?"; e depois de desligar, meio envergonhada, sorri para o gajo, "coitadinho, adormeceu ao colo da minha mãe...", assim como que a desculpar-se.
- bom. O rebento cresce... começa a tornar-se autónomo, e a gaja pouco a pouco começa a ter outra vez uma vida mais normal, e o que acontece? Um belo dia ela olha para o seu gajo e murmura-lhe ao ouvido: "sabes, queria ter outro bebé"... ao que o gajo fecha os olhos e sorri. "estava mesmo a pensar nisso agora...", e lá se lançam para debaixo dos lençóis, esquecidos por momentos e completamente das noites sem dormir, das birras, dos choros, das cólicas, dos cocós, do cheiro a leite azedo...
- e lá começa a saga de novo! Novo rebento, o mesmo filme! Com a diferença que agora são dois e o trabalho é a dobrar! Às tantas a gaja já nem se lembra do que é ir ao cinema, muito menos jantar fora só com o seu gajo, muito menos trocar dois dedos de conversa de jeito com alguém com idade superior a 3 anos! E o filme vai rodar mais 3 anos ainda!
- e quando o nosso segundo rebento começa a dar ares de crescido, e a gritar enraivecido: "ê já nã xou bebé!!!", apesar de ainda se agarrar às saias da mãe e não a deixar fazer nada o santo dia, quando se começa a vislumbrar no horizonte tempos de mais calma, paz, autonomia das criancinhas, finalmente começar a pensar em si própria, a fazer planos para o futuro, qualquer dia já podem ficar a dormir na casa de um amigo, já se vestem e comem sozinhos, já não precisam que lhes limpe o rabo nem que ande atrás deles a acender as luzes, já não precisam dos meus braços constantemente nem dos meus cabelos para adormecerem, já posso ir trabalhar e quem sabe, uma noite, ao cinema, jantar fora, dar um pezinho de dança, descontrair...
- eis senão quando, lá do fundo das suas entranhas, a gaja começa a sentir umas saudades estranhas daquela coisa fofa e minúscula chamada recém nascido, uma nostalgia imensa da barriga a arredondar e a ganhar volume, uma vontade enorme de sentir as mamas a rebentar em leite outra vez, e começa a sonhar alto, é pá, nunca mais vou sentir aquele cheirinho a bebé nos meus braços... só mais uma vez, vá lá...
- e um belo dia diz para o seu gajo (assim pertinho do ouvido): "sabes, queria tanto ter outro bebé..."
- só pode estar a dar em doida, não acham???
O que vale é que isto é só um delírio do meu instinto maternal (espero!)
ISTO É INGLATERRA II
As chaminés de Londres
são, na sua maioria, chaminés-fantasma. Por elas só sobem os fumos de antigas lareiras de sala, que ainda funcionem. Quando isso não acontece, estão mesmo lá só para enfeitar.
A maioria das casas não tem exaustão na cozinha. O escoamento dos fumos das caldeiras dos aquecimentos centrais são feitos por pequenos buracos nas paredes, e por um tubo que atravessa esse buraco, como podemos ver na fotografia de baixo. Estas zonas de escape de fumos existem em todas as casas à altura do andar térreo (que é onde ficam as cozinhas).
Em algumas casas, o escoamento de águas é feito desta maneira:
quarta-feira, fevereiro 01, 2006
ESTRANHOS HÁBITOS
Querida Sandra:
Devo confessar que, no primeiro momento, não achei lá muita graça a isto. É que sempre embirrei com coisas deste género, nunca achei muita graça, sei lá! Achei que ia ser a primeira a quebrar a corrente...
Mas depois fiquei a pensar... e começaram a ocorrer-me algumas coisas engraçadas! Olha, levaste-me na conversa, foi o que foi ;)
Então, lá vai! Os meus estranhos hábitos (só cinco, atenção!)
- decalçar os sapatos mal entro em casa (e toda a família faz o mesmo - é um hábito herdado, mas a única forma possível de manter esta alcatifa com um ar apresentável, apesar das nódoas e de migalhas e de outras coisas inumeráveis que a enfeitam diariamente).
- cumprimentar as pessoas com dois beijinhos, homens incluídos - este é estranho aqui, em Inglaterra! Aliás, já cometi algumas gafes, mas estou a integrar-me progressivamente nos costumes locais ;)
- ando sempre com toneladas de papéis e papeizinhos na carteira (lixo, digamos assim), não percebo porquê, acho que é por artes mágicas que lá vão parar ;)
- trocar o nome dos meus filhos - este só é estranho para pais de primeira viagem; eu também não acreditava muito quando me diziam isto, até ter o segundo!
- tirar os pelos das pernas com uma pinça!
Mas como eu gosto de ser original, vou acrescentar mais dois!
- tomar banho todos os dias - este também é estranho aqui em Inglaterra (!)
- reler livros - quando gosto mesmo de um livro, sou capaz de relê-lo inúmeras vezes, acho que já cheguei às 10!
Pronto, e mais não digo! Agora a parte de escolher 5 pessoas é realmente difícil para quem, como eu, nunca achou grande graça a estas coisas... Mas olhem, eu vou fazer a minha escolha, vocês, os atingidos, sintam-se à vontade para quebrar a corrente, se não estiverem para aí virados!
Então vamos ao sorteio:
Vá lá, não me fuzilem! :D
E VAMOS AO TERCEIRO!
Primeiro tenho de dizer que José Eduardo Agualusa é um dos meus autores preferidos.
Angolano, jornalista e escritor, conhece como ninguém a realidade angolana, a da guerra e a do pós-guerra, as intermináveis lutas e abusos de poder, a luta diária de um povo pelos seus direitos básicos, a miséria desse povo enquanto a riqueza do país está a saque e nas mãos de largas dúzias de governantes corruptos. É esta realidade que ele nos traz em alguns dos seus livros.
Mas este autor é acima de tudo um cidadão do Mundo: já viveu também em Berlim e no Rio de Janeiro. Um dos seus livros, O Ano em que Zumbi tomou o Rio, retrata-nos o cenário de um Brasil à beira de uma autêntica guerra civil, uma revolução armada que tem início nas favelas, e traça-nos um retrato impressionantemente realista do que se passa nesse "outro mundo" marginalizado, o dia a dia de confrontos armados com as forças policiais, o negócio e tráfico de armas que prospera nos becos e nas ruelas. Cenário que é quase uma premonição: se os governos não tomarem medidas reais e não encararem o problema de frente, esta guerra pode explodir a qualquer momento.
Mas dos seus outros livros falarei noutra altura; hoje queria sugerir-vos a leitura de Estranhões e Bizarrocos: um conjunto de estórias para crianças absolutamente delicioso. É que, para além de tudo o que já referi, a escrita de José Eduardo Agualusa possui uma poesia e uma sensibilidade humana profundas. Cada estória é uma flor rara de ternura e beleza.